Palha Assada com Azeite
Produção de enganação em escala industrial.
Palhaços são controversiais. Assunto delicado.
Alguns amam. Outros odeiam. Parece que, na história, houve apenas um serial-killer que se vestia de palhaço e foi suficiente para fazer um estrago na reputação do artista que, mesmo triste, trabalha para divertir os outros, abnegadamente.
Aqui no Brasil o termo as vezes é usado pejorativamente para designar alguém que foi enganado. Alguém que foi trapaceado - se diz que esta "pessoa foi feita de palhaço".
Mesmo que eu não concorde, tenho que aceitar que é assim no Brasil. Pior que o mau-uso da palavra é a sensação de sermos enganados o tempo todo. É preciso ficar alerta e, mesmo assim, pouco adiantará o nosso esforço.
São embalagens que se transformam com discretos avisos de que a 'receita mudou', 'a quantidade diminuiu', numa 'estratégia de design' (a mais pura maracutaia mesmo) que torna a mudança quase imperceptível (e nunca é para melhorar). As embalagens mudam de um jeito tão sutil que é quase como se o produto estivesse dizendo: "Ah, não, eu não mudei. Apenas minha embalagem, meu conteúdo continua o mesmo... na maior parte" - mas é sempre menos quantidade e menos qualidade. Infalível. Seria uma surpresa enorme que um dia a gente fosse no supermercado e encontrasse nosso produto preferido assim:- "Agora em nova embalagem com 150g a mais e trufas de verdade!". Só rindo mesmo.
Pelo hábito a gente compra manteigas, óleos, preparados misteriosos, 'bebidas-lácteas' (ou sei lá o que isto venha a significar de verdade) que há muito tempo já não são mais aquilo que experimentamos a primeira vez, quando nos apaixonamos por eles.
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Você vai comprar milho e leva palha assada (entendeu? Esta é uma piada que apesar da má-qualidade, não causa câncer).
No quesito enganação, os azeites de oliva são um caso de polícia. Vendidos a preço de ouro, são óbvios candidatos dos falsificadores - estes profissionais no talento de enganar e roubar as pessoas. Não estou falando dos de origem duvidosa ou clandestina. Falo daquilo que é vendido nas prateleiras dos supermercados.
Na ficção a Família Corleone (de O Poderoso Chefão) disfarçava os crimes mafiosos com um negócio de fachada de óleo de oliva (Genco! E o óleo era bom!). Se eles soubessem o quanto dá lucro falsificar o próprio óleo, não iam mexer com cassinos ou se arriscar em matar gangsters.
Lembro da primeira vez que eu vi o irmão do meu pai botar azeite de oliva no arroz com feijão. Experimentei. Como ficou bom! Eu era criança e só muito tempo depois vim a descobrir os benefícios de consumir azeite de oliva. Era uma latinha de azeite de uma marca famosa, com uma ave macho no rótulo. Quando eu e meu pai viajávamos, comíamos em restaurantes simples de beira-de estrada. Estava lá, em cada mesa, quase sempre, uma latinha de um outro óleo fabricado no Brasil desde 1942:- O Óleo Maria. Honesto, dizia ser metade de óleo de oliva e metade de soja (parece que a fábrica original que fornecia óleos para a indústria têxtil, percebeu uma oportunidade na dificuldade de se importar azeite de oliva para o Brasil e criou o produto que chegou a estar em 70% das casas brasileiras). Um sucesso.
A marca famosa então virou objeto de desejo de investidores. Passou de mão em mão e em cada passada, a Maria (a portuguesa do rótulo) ficava mais jovem - passou de uma senhora de 40 anos para uma moça de 19) e o óleo, adivinhe? Menos bom. Da lata passou para uma garrafinha plástica. Que eu comprei. E, quando a minha esposa falou no almoço:- "É, nem o Óleo Maria tem o mesmo gosto de antes", eu peguei a garrafinha (feia e mole) e notei em dizeres bem discretos, numa letra bem fininha, um anúncio pseudo-positivo de "nova receita!" (claro, é uma receita nova, como se pedir um cheeseburger e receber um sanduíche de papelão fosse uma receita inovadora) - que anunciava logo abaixo da frase "mais sabor em sua mesa" que agora só havia 10% de azeite de oliva! Três azeitonas enormes e folhas de oliveira emolduravam a Maria (nenhum grão de soja! Tudo bem... Nem o Óleo Soya tem soja na embalagem). Continha também (muito discretamente, feito para apenas evitar entraves jurídicos) letreiros laterais com a famigerada expressão "Foto Ilustrativa" (que para mim é como dizer 'porta de abrir e fechar' ou 'papel higiênico para limpar' - foto em rótulo é para ilustrar!! Não enganar! Todos sabemos que o uso destas duas palavras é para disfarçar a verdade:- "o produto aqui não tem nada a ver com a foto - a foto é só de enfeite - não ilustra nem o conteúdo desta garrafa - é só decorativo!") e o outro escrito alertando que a soja era do tipo transgênico mesmo (nem era uma soja premium). A Maria era uma mulher honesta, não enganava ninguém (será?). Agora a Maria moça, com a cara blasè, meio que querendo estar em outro emprego, não garante nem os 50% de azeite de oliva. É só 10% mesmo. É isto. É só.
Triste. Triste com T de Transgênico, dentro de um assustador triângulo amarelo.
Estamos na época do suco de frutas sem frutas, do chocolate sem cacau...uma delícia, tão saudável quanto uma pilha.