Por que a formação universitária é importante? Reflexões sobre diplomas e o paradoxo da ignorância
"Só sei que nada sei" segundo Sócrates ou "Só sei que foi assim" segundo Chicó. O manejo e estruturação do conhecimento é ativo essencial para grandes e pequenas consultorias. E, embora haja um consenso que apenas a educação formal não é o suficiente, o que explica a manutenção do pré-requisito de um diploma universitário para acessar a grande maioria das vagas de emprego?
Primeiro, o problema: De um lado, parece haver uma conscientização cada vez maior, por parte das empresas, de que a graduação não é algo definitivo ou até mesmo essencial para o desempenho de funções. É possível ver isso com a flexibilização dessa exigência, especialmente em vagas exigindo cursos cada vez mais amplos para funções que antes estariam estritamente associadas a uma formação. Contudo, do outro lado, questiona-se essa própria exigência. Por que, até mesmo em áreas conhecidas pela sua liberalidade como as de tecnologia, essa regra de um curso superior se mantém? O que poderia explicar isso?
Bom, as explicações podem variar. Desde um dos critérios objetivos para adquirir certas certificações, passando por uma ferramenta útil de instrumentalização do trabalho de recrutadores ou até mesmo um dos pilares culturais daquela organização.
Contudo, um argumento constantemente ignorado, mas muito convincente, está no chamado Efeito Dunning-Kruger, também chamado do paradoxo da ignorância ou síndrome do idiota confiante.
Segundo os professores David Dunning e Justin Kruger, existe uma limitação em avaliarmos e compreendermos o que, de fato, sabemos. Tal fenômeno pode ser visualizado pelo seguinte gráfico:
Nele, utilizando o exemplo de uma pessoa que começou em um novo campo de estudo, é possível ver que, enquanto avança em "Competência" (eixo X), a "Confiança" (eixo Y) tende a atingir um pico (de "Sou um gênio"), passando pelo seu ponto mais baixo (de "Não sei nada") até chegar em um ponto de crescimento estável ("Sei bastante, mas sei das minhas limitações").
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Das diferentes interpretações que podem ser extraídas, como a Síndrome do Impostor em profissionais médios ou a importância de se trabalhar as habilidades comportamentais e interpessoais em profissionais experientes, o Efeito Dunning-Kruger é mais devastador em profissionais em início de carreira.
Desde tomada de decisões erradas, passando por condutas que atrapalham o ambiente colaborativo da equipe, chegando até ao extremo de insubordinação. A ausência de compreensão acerca do quanto não se sabe pode ser nocivo para uma carreira. E se o problema existe no âmbito individual, ele pode ser um risco para organizações sem os devidos processos internos, especialmente startups que realizam demissões em massa e recontratam profissionais "jovens" (sem experiência de mercado ou até mesmo formação acadêmica).
Então, o argumento pode ser expresso da seguinte maneira: considerando que é impossível avaliar a totalidade do conhecimento de uma pessoa, contratar profissionais sem experiências anteriores pode ser um risco. Dito isso, a formação acadêmica torna-se um importante filtro, dado que presume-se que o profissional tenha adquirido habilidades técnicas e tido noção do seu campo de estudo ao passar pelo ambiente universitário.
A ideia é que o profissional, tendo noção do seu campo de estudo e munido de habilidades técnicas necessárias, aumenta sua capacidade de solucionar problemas práticos e buscar soluções inovadoras em diferentes áreas que, a princípio, não domina. Porém, trago dois contrapontos:
1º - A associação de que a universidade fornece esses dois elementos (habilidades técnicas e noção mínima do campo de estudo) pode ser falsa. Não é incomum que ótimos profissionais afirmem "não terem aprendido nada" com a graduação. Dito isso, defende-se que a passagem pela Universidade seja apenas um dos "aferidores de noção da própria ignorância", podendo ser combinada com a avaliação de portfólios (ponto pouco explorado por maioria das áreas) e experiências anteriores.
2º - Esse argumento pode ser utilizado para restringir (ainda mais e de maneira errada) profissionais iniciantes. A ausência de experiência corporativa, justificativa mais que utilizada para não contratar profissionais iniciantes, acadêmicos ou em transição de carreira, pode encontrar uma base de apoio na ideia de que a formação acadêmica e experiências anteriores são essenciais para que "o ignorante tenha dimensão da sua ignorância". Porém, dado o primeiro problema de associação lógica, o contraponto reside em mais duas questões: (a) a "experiência" deve ser entendida em sentido amplo, não devendo ser contabilizada apenas em períodos de contratação por empresas. Deve-se, ao avaliar se um profissional possui ou não experiência, contabilizar períodos de voluntariado, empresas juniores, participação em organizações de eventos e produção acadêmica/iniciação científica; (b) por "habilidades técnicas" deve-se entender, cada vez mais, a capacidade de lidar com ferramentas básicas de produção, gestão e comunicação (coisas não ensinadas em boa parte dos cursos superiores).
Por fim, a tese principal aqui defendida é que, dada a ausência de fórmula perfeita, a Universidade se mantém como importante métrica de que o profissional possui noção dos limites do seu conhecimento (e saiba onde buscar novas soluções para os problemas práticos), mas está longe de ser a única, devendo ser combinada com experiências acadêmicas, profissionais (no sentido amplo) e estruturação de portfólio.
Advogada em Real Estate - Imobiliario | Agro | Ambiental | Regulatorio
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