Portugal, tão fraca Mãe mas tão boa Madrasta.

Portugal, tão fraca Mãe mas tão boa Madrasta.

De entre as muitas estatísticas de que faço parte, umas voluntariamente outras nem por isso, hoje passo a fazer parte de uma estatística involuntária e do qual também fazem parte milhares de Pais Portugueses.

Hoje vou levar a minha filha ao Aeroporto. Vai para outro pais trabalhar porque no país onde nasceu, estudou e se formou, aos 26 anos não consegue arranjar emprego, quanto mais um que lhe permita afirmar a sua independência e começar a planear o futuro.

Desabafaram muitas vezes ela e os amigos: “sentimo-nos, frustrados e enganados. “Venderam-nos” a ideia de que se estudássemos muito e tirássemos boas notas, dadas as estatísticas da empregabilidade, não teríamos problemas de colocação no mercado de trabalho, etc”, mas chegado o momento de ir para o mercado, a frequência com que começaram a ouvir frases como estas fez crescer o sentimento de engano e frustração:

"Lamentamos, mas não tens a experiência necessária"; "Não aceitamos estagiários"; "Os estágios disponíveis não são remunerados, mas oferecemos a possibilidade de ganharem experiência o que já é bastante bom" ou nos raríssimos casos onde até há alguma remuneração, o valor proposto por vezes nem chega ao valor do ordenado mínimo.

Admira-se depois um país inteiro quando vê a falta de profissionais qualificados em diversos sectores da sociedade que 1 em cada 3 jovens entre os 15 e os 39 abandonem o país. Actualmente e de acordo com o observatório da emigração, 30% dos jovens entre os 15 e os 39 abandonaram o país. São cerca de 850 mil jovens de acordo com a informação disponibilizada já este ano, sendo que 2023 foi um dos anos em que se viu um maior êxodo, cerca de 120 mil jovens saíram de Portugal só nesse ano.

 Confrontada com este cenário de poucas perspectivas, começa-se a pensar em oportunidades fora de Portugal e um dia, entre as já várias oportunidades exploradas surge uma E.F.S.A. (European Food & Safety Authority).

Pensa: “Porque não?, mas …pffff.. deve ser deve…” já com o ânimo condicionado pela realidade Portuguesa, “…não tenho experiência, nunca na vida uma organização destas me vai considerar.” Depois instala-se a revolta “Ahhh que se lixe mando candidatura á mesma, o que é que tenho a perder? “Enviar a candidatura, serve de certa forma para apaziguar a consciência de não ter desistido e até já considerar, contra vontade, sair de Portugal. “

Um dia recebe um email: We’ve reviewed your candidacy and we would like to invite you to an online meeting as a first approach to better assess your candidacy and motivation to join EFSA. Desde o primeiro email, passando pela entrevista, UMA ÚNICA,  até á decisão final foi um “ver se te avias” e do nada: “We are pleased to inform you that after careful consideration, we would be delighted if you were to join EFSA, starting October 1, 2024. You have 3 days to consider our proposal.”

 Primeiro instala-se a incredulidade, que depois dá lugar a uma certa euforia pela oportunidade alcançada, segue-se a operacionalidade da “coisa” “Então e agora? vou ter que arranjar casa para morar” Começa a pesquisa insana de se aventurar num mercado imobiliário que não se conhece, mas vá lá que o Pai tem uns amigos em Itália que dão uma preciosa ajuda na procura, no entendimento do mercado, na revisão do contrato e dão umas dicas preciosas…a azafama da procura dá lugar á calmaria. “.. boa tenho já tenho casa, bilhete de avião confirmado e as coisas coordenadas com a EFSA” e é no momento quando se começa a fazer as malas que a realidade atropela qual camião desgovernado: Vou-me embora, vou deixar os meus amigos, a minha família, as actividades onde estava inserida, entre tantas outras coisas que uma jovem de 26 anos com o “sangue na guelra” como diria a avó, se envolve. Vou ter que sair de Portugal para outro país, porque o país onde nasci, vivo, estudei e Me formei e que tantas facilidades dá aos outros que querem vir para cá, a mim não me dá condições para poder ficar.

Revoltam-se quando vêm as televisões nacionais a entrevistar estrangeiros a viver e a trabalhar em Portugal, a pagar valores de rendas incomportáveis e em alguns casos até absurdos, mas que comparativamente com o seu país de origem, até os acham relativamente baratos e isto sem falar que viver em Portugal, seja pela gastronomia, pela praia, pela cultura, pela segurança e pelas facilidades que lhes são concedidas é em si uma benesse.  Questionam como é que isto é possível? e deparam-se com o facto de que Portugal em 2009 criou um regime especial a que apelidaram de “Residentes Não Habituais”, um regime que permitiu que trabalhadores por contra própria ou por conta de outrem, permanecendo em Portugal por um período superior a 183 dias e fixando a sua residência fiscal cá pagariam somente 20% de IRS, por um período de 10 anos renováveis independentemente do montante dos seus rendimentos.

Como diria a minha avó na sua infinita sapiência popular.. “quando Portugal pôs mão á orelha, já não deitava sangue”, quando passados uns anos Portugal viu que este regime estava a contribuir para um aumento significativo dos preços imobiliários em particular, mas também de outros no geral, com especial incidência nas grandes zonas urbanas, decidiu demonstrar que também tem interesse em ser o garante da igualdade e do bem estar dos seus cidadãos e optou por acabar com o regime, deixando, no entanto, uma porta aberta a que designou “regime transitório” para quem tenha avançado com os pedidos até ao final de 2023, mas como Portugal, democrático como se quer, muda com a feição dos ventos democráticos, esse regime especial prevê-se que venha eventualmente a ser reinstaurado, com todas as suas benesses e facilidades, mas somente acessíveis a estrangeiros.

Já os de cá, têm que se resignar a ser estrangeiros noutro país.

Hoje vou levar a minha filha ao aeroporto para emigrar para outro país, passarei então, infeliz e involuntariamente a fazer parte de uma amarga estatística.

Para apaziguar o amargo de boca de Pai, socorro-me da infinita a sapiência popular quando chora: “Ah Portugal, Portugal tão boa madrasta, mas tão fraca Mãe”

Adeus Portugal…

Olá Itália…

Paulo Almeida

Senior Sales Manager, Rohde & Schwarz Portugal

3 m

Francisco, artigo que, salvo raros casos, espelha a nossa realidade. Li com muito interesse. Tudo de bom para a tua filha. Um abraço.

Francisco muito obrigado pela mensagem Que tudo corra de feição com a tua filha Um grande abraço

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