Capítulo 3 - A relevância da Neurociência no entendimento das tomadas de decisões

Capítulo 3 - A relevância da Neurociência no entendimento das tomadas de decisões

As heurísticas de Kahneman e Tversky nas tomadas de decisões


Há o conhecimento, por diversos estudos, de que nem toda escolha feita pela pessoa é realizada a partir de uma decisão racional (Cappellozza & Sanchez, 2011). Diante das limitações em obter informações completas os consumidores são levados a tomar decisões não racionais, a partir de escolhas parcialmente intuitivas, com referenciais em incertezas.

De acordo com Kahnemann e Tversky, o ser humano toma suas decisões de acordo com dois sistemas existentes na mente:

  • Sistema 1, considerado Sistema Rápido – pensamento automático e rápido, com pouco ou nenhum esforço e nenhuma percepção de controle voluntário.
  • Sistema 2, considerado Sistema Lento – pensamento de maior concentração e vagaroso, que necessita de atividades mentais complexas, incluindo cálculos.

E, a aplicação do modo rápido de analisar um problema e resolvê-lo é baseado em referências próprias. Assim, as decisões dos consumidores passam a ser afetados por seus hábitos, crenças, relacionamentos sociais, interesses, experiências, entre outros.

No caso do consumo consciente pelo ser humano, tanto relacionado ao consumo do necessário (conceito dos 3Rs: reduzir, reutilizar e reciclar) quanto ao consumo de produtos que não agridem o meio ambiente (produtos denominados como Eco), mostra-se necessário reflexões e debates, com o Governo, com as empresas, com a população, sobre as ações atuais de consumo e o que deve ser realizado para a conscientização e ocorrência de mudanças efetivas no comportamento de compra.

No Brasil, empresas e organizações já fazem ações nesse sentido, como o exemplo citado anteriormente da venda de sacolas plásticas nos supermercados e incentivo do uso de sacolas recicláveis, e outros, como a iniciativa da Natura que possui parcerias com produtores rurais para a exploração consciente e o manejo controlado de algumas das riquezas naturais do país: castanha do Pará e erva doce. A Unilever, empresa multinacional anglo-holandesa, tem como um de seus pilares no Plano de Sustentabilidade,  a busca pela promoção da boa nutrição e da boa higiene, com produtos que gerem impacto positivo em dois dos maiores desafios da saúde no mundo: a doença cardiovascular e a diarreia. Empresas menores, contudo, não menos importantes, também estão atuando no foco da sustentabilidade como a Papel Semente que produz papel artesanal incorporando sementes de flores, ervas ou hortaliças em sua composição, permitindo que o papel seja plantado após o uso, resultando em florescimento e crescimento de plantas, criando um ciclo sustentável.  Mas, há a necessidade de maior envolvimento de todos os segmentos, trabalhando juntos frente ao tema na busca por mudanças de comportamento no consumo. 


A regência dos princípios heurísticos no consumo

Todos os dias o ser humano encontra-se diante de inúmeras escolhas, com a percepção de que são decisões sempre racionais. Contudo, Herbert Simon, nascido na Pensilvânia em 1916, renomado economista, psicólogo e filósofo, afirmou que o ser humano não é capaz de tomar decisões totalmente racionais pelas limitações cognitivas e de informação, criando o conceito de “racionalidade limitada”. Segundo Simon (1955) o ser humano toma decisões satisfatórias, consideradas boas para atender às suas necessidades imediatas, mas não necessariamente são as melhores.

No modelo de racionalidade limitada surgem os princípios heurísticos, que são ações simples, denominadas de Regras de Ouro, tomadas pelo ser humano e que auxiliam no encontro de respostas “adequadas”, ainda que  “errôneas”, para problemas mais complexos e que regem o nosso cérebro, influenciando em todas as decisões, inclusive as de consumo. Esse modelo também considera a existência de incertezas e riscos nas decisões, considerando que o ser humano, geralmente, não tem todas as informações necessárias para tomar uma decisão completamente informada. Desse modo, o ser humano busca a simplificação e atalhos mentais para chegar a uma decisão.

Dando continuidade ao estudo de Simon, diferentes economistas, psicólogos e cientistas da computação modificaram e ampliaram o modelo. Entre eles, Daniel Kahnemann, israelense, psicólogo, ganhador do Prêmio Nobel de Economia, que juntamente com Amos Tversky, pioneiro da ciência cognitiva, desenvolveram diversos experimentos e, a partir deles, descreveram as heurísticas e os vieses cognitivos.

Segundo Kahnemann e Tversky, o ser humano utiliza as heurísticas, modo rápido de análise, que auxilia na hora de resolver um problema, com base em referências próprias, considerando a memória, os estereótipos, os valores, as informações que possui, entre outros. E, as consequências negativas surgem quando as referências não são corretas, o que pode levar a pessoa a encontrar dificuldade de avaliar as opções que possui de forma clara, surgindo os vieses cognitivos.

Dos estudos realizados pela dupla foram identificadas três regras gerais ou heurísticas:

  • Ancoragem – Em uma ocasião de incerteza, a pessoa não possui conhecimento experiencial sobre a situação e, ela toma um ponto de referência, uma âncora, algo conhecido e, pelos ajustes intuitivos, resolve essa ocasião de incerteza. O viés ocorre porque geralmente os ajustes não são suficientes para resolver o problema.
  • Disponibilidade -  pensar na probabilidade de uma situação, a frequência de uma categoria ou a associação entre duas variáveis. O pensamento ocorre pela disponibilidade ou pela frequência de casos que vêm à mente da pessoa considerando sua experiência. Essa heurística auxilia na explicação de comportamentos relacionados aos riscos, em âmbitos públicos e privados relacionados à precaução.
  • Representatividade – conhecida como heurística da similaridade. É a inferência sobre a possibilidade de que um estímulo qualquer seja de uma determinada categoria, baseada nas características superficiais e com o apoio de esquemas anteriores já existentes na pessoa. 

Considerando a influência das heurísticas nas decisões e que ações irracionais existem, torna-se relevante analisar se existe a influência de alguns princípios heurísticos na escolha entre um produto com foco no conceito de sustentabilidade versus outro produto não sustentável, com o intuito de refletir qual é o momento atual em que o ser humano se encontra frente ao consumo de produtos sustentáveis e ao tema sustentabilidade.

Assunto que trataremos no próximo post.

Entre para ver ou adicionar um comentário

Outros artigos de Cristina Castilho Ratnieks

Outras pessoas também visualizaram

Conferir tópicos