RESPEITE A LINHA DE FRENTE
Hoje li um emocionante relato de uma colega da Caixa, onde trabalhei por 31 anos, sobre as condições angustiantes enfrentadas por quem está atendendo as imensas filas de desesperados que esperam receber o auxílio financeiro que poderá ser a diferença entre comer ou não comer nos próximos dias. Da mesma forma, temos visto a luta dos médicos, enfermeiros e demais profissionais da saúde, que se unem a legistas, coveiros, policiais, entregadores, motoristas e uma gama de profissionais que estão na linha de frente tentando dar conta deste enorme desafio, muitas vezes sendo destratados pelos que deveriam agradecer, e, ao contrário, perdem o equilíbrio e a noção de causalidade.
Por isso peço: antes de jogar toda sua agressividade, raiva e frustração sobre quem está atendendo nos bancos, postos de saúde, funerárias, cemitérios e hospitais, procure lembrar que eles estão como quem carrega baldes de água tentando apagar o incêndio na gigantesca floresta seca.
E que esta floresta alegórica vem secando há muitos e muitos anos, desde que a vida humana deixou de ser o valor mais importante, gerando descaso, descuido, imprevidência, destruição do meio ambiente, sistemas onde pessoas se tornam apenas engrenagens e meios (ou “rescursos humanos”) para se atingir um fim, que invariavelmente significa, quase sempre, enriquecer cada vez mais o topo da pirâmide.
Há tempos os cientistas já sabem que vírus potencialmente pandêmicos poderiam surgir. E já haviam alertados os governos e as organizações internacionais.
Preparar-se para enfrentá-los significaria oferecer um bom sistema universal de saúde, educação de boa qualidade para todos, investimento em saneamento, redução da pobreza, combate à desigualdade (=combate à concentração desmedida de riqueza), foco no bem comum e não na próxima eleição, dinheiro aplicado para favorecer a vida e o desenvolvimento integral dos potenciais humanos em todos os níveis e instituições humanas e não apenas para enriquecer o patrimônio de alguns.
Preparar-se para pandemias ou mesmo evitá-las, pede o acesso a mais altos níveis de consciência, a compreensão de que somos interdependentes, o fim do egocentrismo (foco apenas em si mesmo) e do etnocentrismo (o cuidado apenas com os da sua tribo) e a inauguração de um real pluralismo, onde a cultura do cuidado se estenda a todos, onde não seja admissível que a vida seja submetida às leis do mercado, que hoje são o sinônimo da lei do mais forte.
A crise causada por esta e qualquer outra pandemia escancara o descaso com o que realmente importa. Tudo o que não foi cultivado, cuidado, gestado, administrado, educado – toda negligência – volta-se agora contra nós.
Apesar disso, alguns estão na linha de frente tentando oferecer o melhor de si mesmos e das estruturas capengas existentes para atender você.
No mínimo, respeite-os. Se tiver grandeza de alma, agradeça, por favor.
Publicado originalmente em www.cesartucci.com.br
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