Sou fria e calculista

Sou fria e calculista

Tem dias em que estou aqui com essa frase na cabeça. Foi algo que ouvi (há algum tempo) em uma dinâmica de grupo, com uma psicóloga tentando descobrir as qualidades da turma. Ouvi de uma colega. E antes de começar a rascunhar as ideias aqui, fui até o dicionário para ter clareza sobre o que queria compartilhar.

Frieza:

- atitude de reserva em relação a pessoas, acontecimentos etc., ausência de envolvimento diante do que se passa em torno; distanciamento.

- estado daquilo que é desprovido de calor; frialdade, friúme, friúra.

Calculista:

- que faz cálculos; capaz de calcular ou mensurar: engenheiro calculista.

- pessoa que só procura o proveito próprio; interesseiro, egoísta.

- aquele que age de maneira premeditada buscando antecipar todas as possibilidades e consequências de uma situação, fato; premeditado.

Voltando à dinâmica, naquela hora fui tomada de surpresa e guardei o sentimento de "tristeza" para pensar depois porque, pelos meus "cálculos", não dava tempo de sentir nada naquele momento. Entendi como uma crítica e guardei para ruminar depois. Terminada a dinâmica, a psicóloga me fez desistir da ideia de ficar remoendo aquilo. "Foi um elogio", disse, sorrindo. A dinâmica/pergunta ou algo do tipo (que não me lembro exatamente) era sobre como trabalhar sob pressão.

Naquele dia, percebi tantos desafios (graças a Deus) que vivi ao longo desses anos e tantos outros que viveria a partir daquela dinâmica. As oportunidades nos preparam, mas isso só acontece se nos permitirmos. Digo isso porque, durante uma crise, não importa apenas o seu diploma, sua especialização, sua experiência. O que importa é o seu estado emocional. E é aí que entra ser "fria e calculista". Frieza para combater o desespero (seu e dos outros) e calcular todas as rotas e saídas.

E a frieza está bem longe de não sentir nada. Porque, na verdade, atuar em uma crise é se permitir sentir, se abrir, olhar ao redor, imaginar as dores envolvidas e se preocupar mais em apontar caminhos, ajudar a resolver, do que se atentar às palavras certas, aos adjetivos, à pontuação. Claro que não dá para menosprezar um bom texto, uma boa nota, bem escrita, articulada, curta e objetiva. Mas se colocar como alguém que sente o problema, imagina o impacto na sua vida e pensa no outro é o que faz de você uma pessoa melhor.

Gosto de crises, e quem trabalha comigo sabe. Dia desses fui alertada para trocar "crise" por "riscos". Não muda muito o peso da responsabilidade. E, na verdade, por mais Poliana que eu seja, prefiro o peso do "lado negro" desse tipo de vivência. Ela me prepara mais. 

Claro que não trabalho para que as crises apareçam. Pelo contrário. Não é a loucura de ter 15 minutos para responder à imprensa sobre um fato ou denúncia que me fascina (não sei vocês, mas para mim é bem comum um "você tem 15 minutos" ou até um "vou publicar a matéria e depois atualizo com sua nota"). É cuidar bem antes que isso aconteça.

Quer um exemplo? Um dia, comentando sobre onde atuo ou atuei, com quais clientes tratava ou tratei disso, um repórter bem próximo soltou um "ah, deve ter sido fácil ser assessora da empresa Y. Nunca vi uma crise por lá". Mal sabe ele como isso é lindo de se ouvir. Gerenciar crise não é apenas fazer nota de resposta. É antecipar, prever, preparar, ajudar a equipe a resolver antes mesmo que algum colega me ligue pedindo um "posicionamento".

Obviamente, não acertei 100% das vezes em que atuei com isso. E posso dizer abertamente isso, sem medo de julgamentos, porque são os erros que ensinam mais nessas horas. Fora que a atuação correta não depende apenas de você. Mas ter frieza, estar calmo, respirar, vai te ajudar a tomar decisões e principalmente orientar. Ninguém vai te ouvir se você gritar nessas horas. E se, mesmo com muita paciência, você apontar a saída e outro não te ouvir, não vai adiantar soltar um "eu avisei". Na verdade, isso apenas piora. As decisões certas (ou erradas) estarão na mesa e você não precisa se apropriar delas para mostrar sua competência. Humildade e empatia bastam.

O que quero dizer com tudo isso? Que um bom profissional precisa (não só na minha área) é trabalhar o emocional, é treinar a paciência, é ser sincero, aberto e atento. O resto, o tempo ensina. 

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