Tripla jornada das mulheres: o que sua empresa tem a ver com isso
Antes de falar da tripla jornada, vamos fazer uma viagem no tempo e ir para o ano de 1960.
Foi nessa época que surgiu aquilo que chamamos de "Segunda Onda do Feminismo". Começou nos EUA e veio como uma reação à domesticação das mulheres nas décadas anteriores, período esse do pós-guerra, quando as mulheres voltaram aos lares depois de uma maciça participação no mercado de trabalho, já que os homens estavam muito ocupados matando uns aos outros na guerra. Nessa segunda onda, ampliou-se o debate para questões como igualdade de gênero, direitos reprodutivos, desigualdades sociais, questões de raça e claro, o direito das mulheres ao trabalho.
Foi também nessa época que surgiu a primeira pílula anticoncepcional que passou a garantir às mulheres seu direito de escolher quando E SE iriam engravidar. Sem dúvida foi uma revolução: ao invés de passarem a vida parindo, agora as mulheres podiam escolher quantos filhos teriam e quando isso iria acontecer. Um dos resultados foi a possibilidade de adiar a maternidade para investir na carreira, obter autonomia financeira e, assim, garantir um futuro diferente daquele que era nos destinado até então.
Bom, nós tomamos a pílula, saímos de casa e fomos para o mercado de trabalho. Entretanto, os homens não retornaram para os lares. Eles continuaram investindo em suas carreiras e, mesmo depois da paternidade, mantiveram-se nesse lugar como provedores da casa enquanto as mulheres "trabalhavam fora", continuavam nos afazeres domésticos e, veja só, também cuidando dos filhos na maior parte do tempo. Foi aí que entrou a tripla jornada nessa história.
No ano passado, a Rede Maternativa participou do programa de TV "Cidade Ocupada", comandado pelo jornalista Fred Melo Paiva. Nesse episódio, ele participou de um dos nossos encontros de empreendedorismo e após ouvir alguns minutos da conversa entre as mulheres, o apresentador - de forma espontânea e fugindo do roteiro - deu um depoimento a respeito dessa desigualdade entre homens e mulheres no que diz respeito ao trabalho X cuidados com os filhos. Confira a partir do minuto 23 do vídeo abaixo:
Vamos agora à questão: o que sua empresa tem a ver com isso.
E a resposta é: TUDO. E vou explicar o porquê.
É comum que dentro do ambiente corporativo os homens sejam mais competitivos e invistam de forma intensa em suas carreiras. Eles estão trabalhando muito, viajando, fazendo negócios, ou seja, arrasando lindamente quando o assunto é trabalho. Muitos desses homens são pais. De um, dois, três ou mais filhos. E sabe como eles conseguem oferecer toda essa dedicação à sua empresa? Porque em casa tem uma mulher dando conta da família. E muitas vezes essa mulher está dando conta da família e também está trabalhando bastante em uma empresa.
Se você trabalha em RH, sabe: o que é que você pensa, instantaneamente, quando a candidata diz na entrevista que é mãe? E quando o candidato diz que é pai? A associação natural que se faz entre homens e mulheres que tem filhos é: o homem tem responsabilidade e será um profissional dedicado porque é pai enquanto a mulher vai faltar porque precisará, em algum momento, cuidar das crianças. Mas olha, caro amigo ou amiga de recursos humanos: a culpa não é sua. Esse é um problema estrutural da nossa sociedade. Não foi você quem criou essa associação automática. A gente, na verdade, cresce acreditando nisso. Porque vemos nossas mães e pais fazendo isso. O tempo todo. Desde os anos 60. Mas dá pra mudar, fica comigo nesse textão.
É possível fomentar algumas políticas afirmativas com foco no público masculino dentro das organizações, de forma a garantir que eles repensem suas rotinas de trabalho para estarem mais presentes com suas famílias, compartilhando de forma mais igualitária os cuidados com a casa e com os filhos:
1 - Medir e cobrar a produtividade dos colaboradores pelos resultados e não necessariamente pelo número de horas trabalhadas. Sabe-se que o trabalhador brasileiro possui baixa produtividade e entre os fatores que contribuem para isso é a falta de foco e objetividade. Desconfie de quem "trabalha muito". Quem tem foco faz o que tem de fazer e sai no horário porque quer ficar com a família, com os filhos, com os amigos ou o que quer que seja. SPOILER: as mulheres que são mães costumam fazer isso!
“O indivíduo chega, toma um café, verifica as mensagens que recebeu, lê o noticiário. Demora uma hora para começar a trabalhar. E quando vai se aproximando do horário do almoço começa a planejar onde vai comer e a produtividade volta a cair (...) O americano larga o lápis assim que deu o seu horário e vai embora, e mesmo agindo dessa maneira é produtivo. O brasileiro tende a fazer mais horas extras”. (Otto Nogami, professor de economia do Insper)
2 - Incentive seus colaboradores homens que são pais a passarem mais tempo com suas famílias. Isso implica dizer que eles podem e devem buscar os filhos na escola, levá-los ao pediatra ou, até mesmo, fazer home office naquele dia em que os pequenos pegaram uma catapora e não poderão ir para a escola. Sua empresa pode criar modalidades de trabalho onde as pessoas possam passar mais tempo em suas casas, dependendo do tipo de trabalho que elas executam.
3 - NUNCA faça um colaborador escolher entre família e trabalho. Ninguém é SÓ profissional. Empatia e compaixão não podem ser aplicadas somente quando um familiar do seu funcionário morre.
4 - Respeite o tempo de licença-paternidade e, se possível, incentive seus colaboradores homens a tirarem férias no mês de nascimento de seus filhos. A participação dele nos afazeres domésticos, no apoio emocional à companheira e no aprendizado dos cuidados com o bebê que chegou são fundamentais para a criação de vínculos que vão durar a vida inteira.
5 - Por fim, veja com admiração a mulher que se dedica ao trabalho e aos filhos. Converse com ela, entenda suas demandas e necessidades e busque encontrar um equilíbrio nas relações, de forma que ela possa exercer sua maternidade da forma como deseja, sem ter de abrir mão de sua carreira por causa disso.
Nada é tão difícil nem tão complicado. Com essas atitudes simples (sim, são simples!) você garante uma maior participação masculina na vida familiar que, naturalmente, reverbera em uma diminuição (ou, se possível, em uma equidade) da carga de trabalho doméstico das mulheres. E o resultado disso é uma empresa fazendo a sua parte na garantia da igualdade de gêneros e transformando relações familiares que, certamente, vão reverberar na produtividade e na qualidade de vida dos seus funcionários. E funcionárias.
Financeiro
7 aParabéns Camila, excelente.
Especialista Sênior de Comunicação Externa, Interna e Employer Branding
7 aVocês (Maternativa) me inspiram e fortalecem. Obrigada!
Gestão em Saúde, Credenciamento Médico, Auditoria, Certificações, Indicadores, Qualidade, Segurança Ocupacional, RH e Ensino
7 aCamila incrível como me enxergo em seus textos! E tenho certeza que outras maternas também! Acredito que nesta questão da jornada tripla somos especialistas e temos muito a agregar justamente por isso! Ser mãe e fazer tudo que eu faço, da forma que eu faço é uma de minhas melhores qualidades! rsrsrsrsrs