Isabella Rossellini investiga vida sexual dos bichos em série: 'Divertir o mundo'

Atriz, de 71 anos, é a filha mais famosa do diretor italiano Roberto Rossellini (1906-1977) e da atriz sueca Ingrid Bergman (1915-1982). Ela ainda é símbolo da luta antietarista na beleza

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Isabella Rosselini Divulgação

Ainda é primavera no Hemisfério Norte, e a estação mais fértil do ano mexe profundamente com a rotina de Isabella Rossellini que, desde 2013, ocupa-se de um novo papel: o de fazendeira. Ela está à frente da Mama Farm, uma fazenda de produtos orgânicos em Brookhaven, no estado de Nova York, onde a atriz, modelo e ativista passa boa parte do ano. “O dia começou bem cedo aqui na fazenda, lá pelas 6h. A parte da manhã eu dediquei aos meus exercícios para as costas, na piscina, e depois à agenda profissional, como esta entrevista. À tarde, vou cuidar das minhas abelhas, porque é primavera, elas ficam agitadas, querem escapar. É preciso checar se as rainhas estão produzindo ovos. Depois, vou levar minhas ovelhas e cabras ao veterinário”, descreve Isabella, de 71 anos, por chamada de vídeo.

A fazenda, que também é uma espécie de parque ecológico, é a mais recente expressão física do amor pela natureza e pelos animais da filha mais famosa do diretor italiano Roberto Rossellini (1906-1977) e da atriz sueca Ingrid Bergman (1915-1982). Um fascínio que se manifestou na ex-musa do diretor David Lynch (“Veludo azul”, 1986, e “Coração selvagem”, 1990), ainda criança; foi diplomado pela Hunter College de Nova York, onde Isabella se formou em Etologia (estudo do comportamento animal) e, há uma década, inspirou “Green porno”, divertida série de microcurtas sobre os hábitos sexuais dos animais. Iniciados em 2008, os 38 filmetes criados pela atriz e produzidos pela TV Sundance — braço televisivo do instituto fundado pelo ator Robert Redford —, estão agora reunidos no especial “Isabella Rossellini: Green porno e outros curtas”, na plataforma Mubi.

É a própria Isabella quem protagoniza as historinhas, encenando os rituais de sedução, acasalamento ou reprodução de diversos tipos de bichos (como libélula, aranha, minhoca, mosca, caracol, peixe), com apoios de recortes de papelão e esculturas de espuma ou borracha. “‘Green porno’ reúne pequenos contos com um ótimo senso de humor e fantasia. E é isso que nós, artistas, fazemos: contamos histórias da maneira mais acessível e divertida possível, e Isabella é uma artista muito progressista e talentosa”, elogia Redford. Ela narra como a ideia surgiu: “Tinha feito o roteiro de um filme sobre o meu pai, chamado ‘Meu pai faz cem anos’ (2005), dirigido pelo Guy Maddin, que Robert havia gostado, e me propôs criar e dirigir uma série. Foi assim que ‘Green porno’ nasceu. Não tinha intenção de quebrar regras, abalar o mundo, mas diverti-lo”, resume a atriz ítalo-americana, sorrindo.

Isabella Rossellini — Foto: Divulgação

A estreia de Isabella como diretora aconteceu durante o longo período de recessão profissional, iniciado quando a Lancôme encerrou seu contrato de exclusividade, em 1996, por ela “ter ousado a passar dos 40 anos”. O acordo com a gigante dos cosméticos incluía cláusula moral, que estabelecia que a atriz poderia ser demitida sumariamente caso se envolvesse em um escândalo. “Negociamos, e eles aceitaram que, para eu ser dispensada, o escândalo deveria acontecer em um grande centro urbano. Fiquei com espaço para respirar”, escreveu a atriz em sua autobiografia, “Um pouco de mim” (1997). Em 2016, a Lancôme a chamou de volta. “Muito além dos valores da marca, Isabella incorpora a ideia de uma beleza que é sinônimo de bem-estar. Mantém uma atitude positiva, que é libertadora”, declarou Françoise Lehmann, gerente-geral da grife à época.

Isabella redirecionou o foco, ampliando o espectro de seus interesses profissionais. “O período entre os contratos com a Lancôme foi bom. Trabalhando menos como atriz e modelo, tive mais tempo para voltar à universidade. Desenvolvi projetos relacionados aos animais; depois, comecei a dirigir meus filmes. Isso tudo trouxe alegria para a minha vida”, conta a atriz, que já posou para capas de revistas de moda clicada por Annie Leibovitz, Robert Mapplethorpe e Richard Avedon.

Embora nascida e crescida no meio cinematográfico — foi casada com Martin Scorsese, e teve romances com David Lynch e o ator Gary Oldman —, Isabella resistiu à ideia de um dia assumir a direção. “Era uma função muito intimidadora, porque meu pai foi um diretor famoso, fui casada com Marty e vivi alguns anos com David. Mas, acho que aprendi com meu pai, principalmente, que, se você tem algo a dizer, o faça com a linguagem que você tem”, explica a atriz. “Então, quando decidi que era hora de contar uma história que realmente desejava, construí meu próprio estilo pegando emprestado coisas que eu havia aprendido. O figurino, por exemplo, era importante, porque fui modelo e me formei na Academia de Figurinistas de Roma, aos 20 anos. Usei o que sabia e simplifiquei o que não sabia para dizer o que me interessava com minha própria voz.”

Isabella Rossellini — Foto: Divulgação

Não há artifícios digitais nos microcurtas concebidos por Isabella: todos foram feitos de forma artesanal. “Isso revela minha ignorância a computadores, com efeitos especiais”, confessa a atriz que, até por isso mesmo, ainda tateia no universo da Inteligência Artificial. “Não domino muito bem, vejo mais como uma ferramenta. A regulamentação da I.A. foi uma das mais importantes demandas durante os quatro meses de greve do sindicato dos atores americanos, ano passado. E concordo plenamente com o nosso sindicato. Não quero que façam uma sequência de ‘Veludo azul’ com a minha imagem e a minha voz, mas que não sou eu ali na tela, por exemplo. Mesmo não sendo dono do filme, o ator é um pouco autor dele, é a integridade do trabalho dele que está em jogo. Não sou contra a tecnologia, mas sou contra os abusos que possam ser cometidos por ela.”

A carreira de atriz começou de forma tímida, em uma pequena participação como uma noviça, contracenando com Ingrid, em “Questão de tempo” (1976), de Renzo Arbore. Seu primeiro grande papel em uma produção americana só veio após a morte da mãe, com o “O sol da meia-noite” (1985), de Taylor Hackford. Era o início de uma trajetória pontuada por filmes marcantes, sob a batuta dos diretores de registros mais diversos, do cinema pipoca de Robert Zemeckis (“A morte lhe cai bem”) às elaboradas e requintadas tramas de Peter Greenaway (“As maletas de Tulse Luper”).

Até hoje, sua presença encanta realizadores de diferentes origens e estilos: está atualmente na grade da Netflix na aventura espacial “O astronauta”, do sueco Johan Renck, e em cartaz nos cinemas com a fábula “La chimera”, da italiana Alice Rohrwacher, no qual contracena inclusive com a atriz brasileira Carol Duarte. “Sou uma grande fã da Isabella, e esperava trabalhar com ela algum dia”, contou Alice à época do Festival de Cannes de 2023, onde “La chimera” concorreu à Palma de Ouro. “Ela é uma mulher incrível, cheia de vitalidade, alegre e, ao mesmo tempo, muito séria profissionalmente, comprometida com tudo relacionado ao filme. Ela não fica interessada apenas na parte que lhe cabe na história.” Na trama, Isabella interpreta uma senhora que acolhe o amor da filha morta, e dá aula de piano em uma mansão em ruínas, sob os cuidados da empregada Itália (Carol). “Tive o prazer conviver, tomar vinho com Isabella e ouvir histórias super bonitas da vida dela nos intervalos das filmagens”, contou a atriz paulista. “Ela entende demais o fazer cinema e, como atriz, tem algo que é encantador para mim: uma sutileza precisa, que vai no cerne da coisa.”

Isabella Rossellini — Foto: Divulgação

Sabedoria adquirida em um ambiente artístico. “Eu adorava visitar meus pais no set. Queria ver os filmes sendo feitos, ouvir as conversas, fazer parte. Minha irmã gêmea, Isotta, por outro lado, era muito tímida. Na última parte de sua vida, papai fez muitos filmes sobre personalidades históricas, como Luís XIV, Sócrates e Pascal, e minha irmã ficava fascinada pelas pesquisas, trocando ideias com historiadores, estudiosos. Ela acabou se formando em História da Arte”, conta Isabella.

Antes de se despedir, avisa sobre mudanças na rotina daquele dia na fazenda, gerida pela filha mais velha, Elettra Wiedemann (fruto de seu casamento com Jo Wiedemann): “Meu filho mais novo, Robert, ligou dizendo que não está se sentindo muito bem hoje, e perguntou se eu não poderia ficar com o filhinho dele, que tem seis semanas. Então essa noite ou vou deixar de ser fazendeira por algumas horas para ser avó”.

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