Design Regenerativo: Superando o Paradigma Mecanicista com Metáforas Ecológicas
Por Natalí Garcia
1. Desafios sistêmicos
Nosso mundo enfrenta crises sistêmicas sem precedentes que afetam as esferas ecológica, econômica, social e de saúde pública. Estas crises são resultado de modelos de pensamento e ação que se mostram cada vez mais inadequados para lidar com a complexidade dos sistemas vivos e suas interações. A visão de mundo mecanicista, enraizada no pensamento cartesiano e no paradigma da separação entre mente e matéria, homem e natureza, feminino e masculino, tem moldado práticas organizacionais e sociais de forma insustentável. Organizações, sejam elas públicas, privadas ou comunitárias, muitas vezes operam com base em uma lógica que prioriza a eficiência econômica e a produtividade em detrimento de uma consciência ecológica e holística.
A metáfora da máquina, predominante desde a Revolução Industrial, ainda influencia profundamente a operação das organizações, que frequentemente são geridas como sistemas fechados, orientados exclusivamente para a obtenção de resultados econômicos. Este paradigma mecanicista, que vê o mundo natural como um recurso a ser explorado e não como um sistema vivo e interdependente, perpetua práticas que agravam a insustentabilidade dos modos de vida humanos. A crise do antropoceno, marcada pela degradação ambiental e pela desigualdade social, é, em grande parte, consequência desta visão reducionista que desconsidera a interconectividade dos sistemas naturais e sociais.
Diante deste cenário, surge a necessidade urgente de repensar os paradigmas que moldam nossas práticas organizacionais e sociais. A sustentabilidade regenerativa emerge como uma resposta que vai além da mera mitigação dos impactos negativos, propondo uma transformação profunda na forma como interagimos com o mundo natural. Este novo paradigma exige uma visão de mundo ecológica, que reconhece a complexidade e a interdependência dos sistemas vivos, e propõe práticas organizacionais que promovam a coevolução harmoniosa entre humanos e ecossistemas.
Entretanto, apesar do crescente interesse por práticas regenerativas, ainda há uma lacuna significativa no desenvolvimento de metodologias aplicáveis no contexto organizacional. As abordagens existentes muitas vezes carecem de orientação prática clara, limitando sua aplicabilidade e impacto. Esta tese, portanto, propõe investigar como o design regenerativo pode ser aplicado nas organizações, explorando suas possibilidades para criar práticas e estratégias mais alinhadas com a realidade ecológica e sustentáveis a longo prazo.
2. Design Moderno e Contrapropostas
O design moderno surgiu como uma resposta às necessidades da Revolução Industrial, buscando otimizar a produção e aumentar a eficiência econômica. Desde o início, o design foi profundamente influenciado pelo paradigma mecanicista, que separa mente e matéria, e pela lógica capitalista que prioriza a maximização dos lucros. Historicamente, o design moderno esteve a serviço do capitalismo industrial, contribuindo para a padronização e a massificação da produção. Isso, por sua vez, levou à exploração intensiva do trabalho humano e dos recursos naturais, reforçando uma visão de mundo que trata a natureza como um mero recurso a ser explorado.
Críticos do design moderno, como William Morris e Victor Papanek, já denunciavam os perigos de um design que servia exclusivamente aos interesses capitalistas, negligenciando as consequências sociais e ambientais de suas práticas. Morris, um dos primeiros críticos do design industrial, vislumbrava uma sociedade onde o trabalho fosse visto como arte e arte como vida, propondo um retorno a práticas mais artesanais e colaborativas. Papanek, por sua vez, foi um precursor do design para a sustentabilidade, enfatizando a necessidade de considerar os impactos ambientais e sociais do design em uma era de produção em massa.
Nas últimas décadas, o movimento de design regenerativo emergiu como uma contraproposta ao design moderno. Fundado nos princípios da ecologia e do pensamento sistêmico, o design regenerativo busca alinhar as práticas de design com os processos naturais, promovendo a regeneração dos sistemas sociais e ecológicos. Ao contrário do design moderno, que muitas vezes reforça a insustentabilidade, o design regenerativo propõe uma abordagem holística e processual, que considera as interações complexas entre os sistemas vivos e suas interdependências.
O grupo Regenesis, formado por autores como Bill Reed e Pamela Mang, é um dos principais proponentes do design regenerativo. Eles argumentam que, para alcançar uma verdadeira regeneração, é necessário adotar uma visão de mundo ecológica que integre as dimensões subjetivas e coletivas dos sistemas humanos. O design regenerativo, segundo eles, não deve apenas mitigar os danos causados pelas atividades humanas, mas também promover uma coevolução saudável entre os sistemas humanos e ambientais.
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No entanto, apesar de seu potencial transformador, o design regenerativo ainda enfrenta desafios significativos, especialmente no que diz respeito à sua aplicação prática em organizações. Muitas das propostas existentes ainda estão em fase embrionária e carecem de metodologias claras e aplicáveis. Esta lacuna metodológica limita a capacidade dos designers de implementar práticas regenerativas de forma eficaz e impactante. Portanto, é necessário desenvolver novas ferramentas e metodologias que possam guiar os profissionais de design e gestores na transição para práticas mais regenerativas.
3. Metáforas Ecológicas para a Antecipação Regenerativa
As metáforas ecológicas desempenham um papel crucial na transformação de visões de mundo e na antecipação de futuros regenerativos. Metáforas, como figuras de linguagem que relacionam o conhecido ao desconhecido, têm o poder de moldar nossa compreensão da realidade e de inspirar novas formas de pensar e agir. No contexto da sustentabilidade regenerativa, as metáforas ecológicas podem servir como ferramentas poderosas para reimaginar nossas interações com o mundo natural e orientar nossas práticas em direção a um futuro mais sustentável.
Uma das metáforas mais poderosas no contexto da regeneração é a de "sistemas vivos". Esta metáfora sugere que as organizações, assim como os ecossistemas naturais, são sistemas complexos e interdependentes que precisam ser geridos de forma a promover a saúde e a vitalidade de todo o sistema. Em vez de tratar as organizações como máquinas que podem ser controladas e otimizadas para maximizar a produção, a metáfora dos sistemas vivos nos convida a ver as organizações como entidades dinâmicas que coevoluem com seus ambientes.
Outra metáfora importante é a de "coevolução". Esta metáfora enfatiza a interdependência entre os sistemas humanos e naturais e sugere que as práticas organizacionais devem ser desenhadas de forma a promover a coevolução harmoniosa entre estes sistemas. A metáfora da coevolução nos lembra que a sustentabilidade não é apenas sobre minimizar impactos negativos, mas sobre criar condições para que todos os sistemas vivos possam prosperar juntos.
Além disso, a metáfora da "regeneração" traz consigo a ideia de transformação e renovação. Em vez de simplesmente restaurar o que foi degradado, a regeneração sugere uma evolução para formas de vida mais complexas, diversificadas e resilientes. Esta metáfora nos convida a ver a sustentabilidade não como um fim em si mesmo, mas como um processo contínuo de transformação e evolução que envolve a criação de novas possibilidades e a exploração de novos potenciais.
As metáforas ecológicas também têm o poder de antecipar futuros regenerativos, ajudando-nos a imaginar e projetar realidades alternativas que estão mais alinhadas com os princípios da sustentabilidade. Elas nos fornecem uma linguagem para expressar novas visões de mundo e para articular novas formas de pensar e agir que podem nos ajudar a superar os desafios sistêmicos que enfrentamos hoje.
No contexto do design regenerativo, as metáforas ecológicas podem ser usadas como ferramentas para orientar processos projetuais e para inspirar novas práticas que estejam mais alinhadas com os princípios ecológicos. Elas podem ajudar os designers a visualizar e criar soluções que não apenas mitigam os impactos negativos das atividades humanas, mas que também promovem a regeneração e a coevolução dos sistemas humanos e naturais.
Em conclusão, as metáforas ecológicas oferecem uma maneira poderosa de reimaginar nossas práticas e de antecipar futuros regenerativos. Elas nos convidam a ver o mundo através de uma lente ecológica, que reconhece a complexidade e a interdependência dos sistemas vivos, e nos desafiam a desenvolver práticas organizacionais e projetuais que promovam a sustentabilidade e a regeneração a longo prazo. Ao adotar estas metáforas, podemos começar a transformar a maneira como pensamos, projetamos e interagimos com o mundo, movendo-nos em direção a um futuro mais sustentável e regenerativo.
Referências e mais informações:
Desenvolvedor front-end
3 mParabéns pelo seu trabalho, muito diferente do que lemos e desejo que logo seja utilizado como un método para os mais diversos trabalho em design..