Direitos Humanos e a Violência do Estado
Muitas são as violências vividas pelas sociedades desde sempre: escravagismo, fome, doenças, intolerância religiosa, falta de acesso à educação, moradia, intolerância cultural, ausência de direitos civis e muito mais...
O primeiro registro que faz menção aos direitos humanos é o Cilindro de Ciro, onde consta uma declaração do rei persa Ciro II. Já na Roma antiga havia um conceito jurídico de concessão à cidadania para todos os romanos. A Carta Magna da Inglaterra (1215) e a Carta de Mandén (1222) também foram associadas aos direitos humanos. Os direitos humanos foram desenhados, ao longo da história, através do debate de filósofos e juristas.
A primeira declaração dos direitos humanos da idade moderna acontece na Virginia, em 12 de junho de 1776, escrita por George Manson. Esse movimento de George influencia Thomas Jefferson, que considera os direitos humanos na Declaração de Independência dos Estados Unidos. Logo chega a vez da França quando, em 1789, apresenta a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão e, por fim, a Rússia, influenciada pela lutas trabalhistas, e o México.
Com a criação da ONU em 1945, o conceito de direitos humanos vem sendo universalizado e aprimorado cada vez mais, ganhando extrema importância mundial. Porém, ele não obriga juridicamente que os Estados a respeitem. Para reverter essa questão foram criados mecanismos em forma de Pactos e Tratados que levassem os Estados a se comprometerem com as determinações da declaração dos direitos Humanos.
Mas, o que são os Direitos Humanos?
A Declaração Universal do Direitos Humanos da ONU afirma que "Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade".
Dos 30 artigos mencionados na declaração dos DH, vemos e vivemos diariamente cenas que contrariam alguns desses tópicos, principalmente por parte do Estado.
Mundialmente, os artigos mais violados do DH, segundo o site Politize, são 6.
- Direito à vida
• O uso da força letal por parte da polícia no Brasil é uma prática que afronta as normas internacionais e tira inúmeras vidas, sendo um número alarmante. Segundo dados de 2019, a polícia mata 1 pessoa a cada 5 horas e responde por 30% das mortes violentas só no Rio de Janeiro;
• No Afeganistão, o número de civis mortos na guerra, em 2018 chegou a registrar 3.804 óbitos;
• Cerca de 14 mil pessoas morreram ao tentarem atravessar o Mar Mediterrâneo. Só no ano de 2019 mais de mil migrantes e refugiados perderam suas vidas no local.
- Violência
• O destaque aqui é para ações policiais que, por conta do poder que lhes é atribuído e, munidos de armamentos letais, podem decidir como e quando agir em suas ações sem que haja qualquer possibilidade de defesa por parte das pessoas por eles abordadas;
• Em 2018, a Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo registrou excesso por parte de policiais, contabilizando mais de 70% das ações com mortes. Em 2014, 15,6% dos homicídios tinham um policial no gatilho e segundo relatório da Anistia Internacional, boa parte deles poderia ter sido evitado;
• Os EUA também registram abusos por parte de sua força policial e é considerada uma das três polícias mais violentas do mundo;
• Por fim, El Salvador, considerado o país mais violento do mundo, atribui esse patamar à guerra civil, mas também aos excessos que sua polícia e forças armadas praticam.
- Escravidão
Esse é um dos temas mais difíceis de serem observados. O fato é que, apesar de ser concedido em meados do século 18, a libertação dos escravos (lembrando que o Brasil foi um dos últimos países a cederem a liberdade aos povos pretos), não havia nenhuma política de socialização e reinserção desses indivíduos na sociedade. Isso causou um estrago irreparável nas sociedades de modo geral, mas principalmente nos países mais pobres, gerando grande desigualdade social, vista ainda hoje e sendo causador de aumento de violência, fome, ausência de direitos de todas as ordens e etc. Ainda que a escravidão tenha sido, oficialmente abolida, não podemos deixar de lado o fato de que ainda persiste em muitos lugares, inclusive no Brasil. Evidente que essa escravidão não é exatamente como registramos em outros tempos, mas sim o produto de uma socialização desigual e injusta que leva muitos indivíduos a se submeterem a situações de escravidão moderna, tendo seus direitos trabalhistas negados e, muitas vezes, ainda mantidos em cárcere privado.
Foto: Blog Palavras Diversas
• Segundo a ONU, o mundo tem mais de 40 milhões de vítimas da escravidão moderna, sendo que 25% das vítimas deste tipo de abuso são crianças;
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• O tráfico de pessoas, a exploração sexual, o casamento forçado e o recrutamento forçado de crianças para uso em conflitos armados são exemplos da evolução da escravidão.
De acordo com dados de 2019:
• mais de 150 milhões de crianças estão sujeitas ao trabalho infantil;
• das 24,9 milhões de pessoas em situação de trabalho forçado, 16 milhões são exploradas no setor privado, como trabalho doméstico, construção ou agricultura;
• exploração sexual forçada afeta 4,8 milhões de pessoas;
• mulheres e meninas são desproporcionalmente afetadas, representando 99% das vítimas na indústria comercial do sexo e 58% em outros setores;
E os outros 3 artigos dos Direitos Humanos mais violados:
- Tortura e maus tratos;
- Julgamento injusto e privação de liberdade;
- Repressão
É evidente que existe o desejo de muitos entes governamentais, setores privados, organizações do terceiro setor e públicos, além de grande parte da sociedade civil em se fazer cumprir o que estabelece os Direitos Humanos. Porém, a história nos prova que precisamos muito mais do que boa vontade e empenho nesse sentido. A violência deve ser encarada como um desdobramento de estados que têm políticas de base enfraquecidas e leis que não garantem direitos iguais, tanto no que se refere aos acessos (educação, alimentação, segurança, saúde..) quanto aos direitos civis.
Foto: AP
O Estado é o ente responsável por zelar por nossa vida e o pleno gozo de nossa cidadania! Mas, o que vemos diariamente, começando pelo mais alto representante do Estado, seguido dos demais poderes, é o descaso que, aliás, também é uma forma de violência. Esse entendimento de que os direitos humanos não são um documento e um contrato valioso para a manutenção de uma sociedade igual e justa contamina todo o grupo de indivíduos que segue atrelado a esses governos, respondendo diretamente aos seus interesses pessoais e inescrupulosos.
Não pretendo com esse texto trazer uma solução para tamanha questão. A ideia que me ocorre é apenas a tentativa de, mais uma vez, sensibilizar meus pares para o cenário em que vivemos e deixar o apelo para que defendamos a ideia de fraternidade e igualdade perante todos.
Referências:
Por Gabriela Savóia