Fértil em oportunidades: desmistificando o agronegócio brasileiro
Existem bons motivos para apoiar — ao invés de estigmatizar ou depreciar — o agronegócio brasileiro. O desempenho positivo do setor nas últimas décadas é atribuído a diversos fatores, e sua importância para a economia tem assumido formas variadas e relevantes. O agronegócio tem oferecido significativa contribuição para o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil. O setor agrícola, que engloba desde a produção agropecuária até a agroindústria, desempenha um papel fundamental na formação da riqueza nacional.
O agronegócio é um grande gerador de empregos no Brasil, envolvendo não apenas trabalhadores rurais, mas também profissionais em setores relacionados, como processamento de alimentos, logística e distribuição. O setor agroexportador é crucial para a balança comercial brasileira. As exportações de produtos agrícolas, como soja, carne, açúcar e café, contribuem significativamente para a entrada de divisas no país.
O agronegócio brasileiro tem adotado tecnologias avançadas na produção, incluindo práticas agrícolas sustentáveis, biotecnologia e automação. Isso resulta em maior eficiência na produção. Além disso, o setor é fundamental para garantir a segurança alimentar da população. O Brasil é um grande produtor global de commodities agrícolas, e a produção interna ajuda a atender à demanda nacional por alimentos.
O setor contribui para a diversificação da economia brasileira, reduzindo a dependência de setores específicos. Isso pode tornar a economia mais resiliente a choques externos e variações nos preços de commodities. O fortalecimento da atividade pode impulsionar o desenvolvimento em regiões rurais, promovendo infraestrutura, serviços e melhorias nas condições de vida das comunidades locais.
A formulação e adequada implementação de políticas governamentais de apoio ao agronegócio são coisas que se justificam pelos impacto positivo das atividades, assim como por sua dinâmica — que torna eficiente e vantajosa a alocação de recursos públicos em ações que contribuam para o desenvolvimento do setor. Políticas como essas podem abranger subsídios, financiamentos, incentivos fiscais, pesquisa agropecuária e programas de desenvolvimento rural. Essas medidas visam a estimular o crescimento do setor, aumentar a competitividade internacional, promover a sustentabilidade e garantir a estabilidade econômica do país.
Por outro lado, o apoio ao agronegócio também tem suscitado debates sobre questões socioambientais, como o desmatamento, uso de agroquímicos e impactos na biodiversidade. Tanto a necessidade de fomentar o desenvolvimento quanto a de tratar destes problemas estão a demandar uma mesma solução: políticas que sejam adequadas, equilibradas, amplas e baseadas em uma visão de longo prazo.
O que boas políticas de apoio têm em comum?
Políticas governamentais bem-sucedidas para estimular o desenvolvimento do agronegócio compartilham várias características comuns. Essas políticas visam criar um ambiente propício para o crescimento sustentável do setor, melhorar a produtividade agrícola, impulsionar a inovação e garantir benefícios econômicos e sociais. Elas reforçam os pontos fortes, ao mesmo tempo que criam condições para lidar com os desafios gerados pelo próprio processo de desenvolvimento. Algumas das características comuns às boas políticas incluem:
Investimento em infraestrutura
Políticas eficazes frequentemente incluem investimentos significativos em infraestrutura rural, como estradas, ferrovias, portos e sistemas de irrigação. Uma infraestrutura robusta facilita o transporte de insumos e produtos agrícolas, reduzindo custos logísticos e melhorando a competitividade do setor.
Acesso a financiamento
Facilitar o acesso a crédito é crucial para o desenvolvimento do agronegócio. Políticas que promovem linhas de crédito agrícola com taxas de juros favoráveis, prazos flexíveis e garantias adequadas incentivam investimentos em tecnologia, equipamentos e insumos, impulsionando a produção.
Pesquisa e Desenvolvimento (P&D)
Incentivos à pesquisa agrícola e desenvolvimento de tecnologias são fundamentais. O suporte a instituições de pesquisa, parcerias público-privadas e programas de extensão agrícola contribuem para a inovação, melhorias na produtividade e adaptação a desafios ambientais.
Ações de incentivo fiscal
Oferecer incentivos fiscais, como reduções de impostos ou créditos tributários, pode estimular investimentos no agronegócio. Essas políticas podem ser direcionadas a atividades específicas, como a modernização de equipamentos, a incorporação de práticas sustentáveis ou a pesquisa e desenvolvimento.
Desenvolvimento de cadeias de valor
Políticas que promovem o desenvolvimento de cadeias de valor integradas e eficientes são cruciais. Isso inclui esforços para conectar produtores a mercados, facilitar a certificação de produtos, promover a agregação de valor e apoiar sistemas de qualidade.
Educação e treinamento
Investir em educação e treinamento agrícola é essencial para capacitar agricultores com habilidades modernas de gestão, técnicas agrícolas avançadas e conhecimento sobre práticas sustentáveis. Programas de capacitação contribuem para a melhoria da eficiência e sustentabilidade do setor.
Segurança jurídica e regularização fundiária
A segurança jurídica é crucial para atrair investimentos. Políticas que buscam garantir a regularização fundiária, proteger os direitos de propriedade e resolver conflitos agrários proporcionam um ambiente mais estável para o desenvolvimento do agronegócio.
Sustentabilidade ambiental
Considerar a sustentabilidade ambiental é cada vez mais importante. Políticas que promovem práticas agrícolas sustentáveis, conservação ambiental e mitigação dos impactos negativos, como desmatamento, são essenciais para a longevidade do setor.
Apoio a agricultura familiar
Reconhecer e apoiar a agricultura familiar através de políticas específicas pode promover a inclusão social e fortalecer comunidades rurais. Isso inclui acesso a recursos, assistência técnica e programas de compra direta de produtos.
A combinação adequada dessas características, adaptada ao contexto específico de cada país ou região, é fundamental para o sucesso das políticas de estímulo ao desenvolvimento do agronegócio. Além disso, a integração entre governo, setor privado, sociedade civil e instituições de pesquisa é essencial para que estas políticas sejam adequadamente implementadas e avaliadas.
Bons (e concretos) exemplos
Diversos países implementaram políticas governamentais de apoio ao agronegócio com sucesso ao longo das últimas décadas. Aqui estão alguns exemplos:
Índia: A Índia também adotou políticas para apoiar o agronegócio, incluindo o aumento do crédito agrícola, investimentos em irrigação, fornecimento de insumos a preços subsidiados e programas de garantia de preços para culturas específicas. Essas políticas visam melhorar a renda dos agricultores e aumentar a produção de alimentos.
Austrália: A Austrália é conhecida por suas políticas de apoio ao agronegócio, incluindo medidas para melhorar a eficiência da irrigação, o acesso a mercados internacionais, e o desenvolvimento de tecnologias agrícolas avançadas. Essas políticas contribuíram para o sucesso do setor agrícola australiano em mercados globais.
Holanda: A Holanda é um exemplo de sucesso na promoção da agricultura sustentável e inovações tecnológicas. Políticas que incentivam a eficiência no uso da água, práticas agrícolas de baixo impacto ambiental e investimentos em pesquisa agrícola contribuíram para o desenvolvimento do agronegócio no país.
França: A França implementou políticas para apoiar a agricultura familiar, promover práticas agrícolas sustentáveis e garantir a qualidade dos produtos agrícolas. Programas de subsídios, investimentos em infraestrutura rural e apoio à diversificação de culturas fazem parte das estratégias adotadas.
Estados Unidos: Os Estados Unidos têm uma longa história de políticas de apoio ao agronegócio. Programas como o Farm Bill fornecem subsídios, seguro agrícola, assistência técnica e outros incentivos para os agricultores. Essas políticas visam estabilizar os mercados agrícolas, promover a inovação e proteger os produtores contra riscos.
China: A China implementou políticas agressivas para modernizar sua agricultura e garantir a segurança alimentar. Investimentos significativos em pesquisa e desenvolvimento, infraestrutura rural, acesso a crédito e programas de subsídios foram cruciais para o crescimento do setor agrícola chinês.
Esses exemplos destacam a diversidade de abordagens adotadas por diferentes países para promover o desenvolvimento do agronegócio. As políticas bem-sucedidas geralmente combinam incentivos financeiros, investimentos em pesquisa e infraestrutura, e medidas que visam melhorar a eficiência e a sustentabilidade do setor.
Grandes desafios exigem respostas à altura
As críticas ao desenvolvimento do agronegócio, como desmatamento, uso excessivo de agroquímicos, concentração de terras, entre outras, são complexas e exigem abordagens integradas para a sua resolução. Seguem-se referências algumas estratégias que têm sido adotadas para enfrentar esses desafios:
Sustentabilidade ambiental
Implementar práticas agrícolas sustentáveis, como a agricultura de conservação, que visa minimizar o impacto ambiental, melhorar a saúde do solo e reduzir a erosão.
Promover o manejo sustentável de recursos naturais, incentivando a adoção de técnicas que preservem ecossistemas, como a agrofloresta e a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF).
Estabelecer e reforçar regulamentações ambientais para controlar o desmatamento ilegal, garantir a recuperação de áreas degradadas e promover a conservação de ecossistemas críticos.
Redução do uso de agroquímicos
Investir em pesquisa e desenvolvimento de práticas agrícolas que minimizem a dependência de agroquímicos, como o uso de culturas resistentes a pragas e doenças.
Promover a educação agrícola para incentivar a aplicação correta de insumos, evitando o uso excessivo de pesticidas e fertilizantes.
Estabelecer regulamentações rigorosas para o registro e uso de agroquímicos, visando a proteção da saúde humana e ambiental.
Reforma agrária e desenvolvimento rural
Implementar políticas que promovam a reforma agrária, a regularização fundiária e a distribuição mais equitativa de terras, reduzindo a concentração de propriedade.
Apoiar a agricultura familiar e comunitária, proporcionando acesso a recursos, tecnologia, crédito e mercados.
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Investir em infraestrutura rural para melhorar o acesso a serviços básicos, como transporte, eletricidade e educação.
Diversificação e rotação de culturas
Incentivar a diversificação de culturas e a rotação de culturas para reduzir os riscos associados à monocultura, melhorar a resiliência dos sistemas agrícolas e promover a saúde do solo.
Oferecer incentivos financeiros para a adoção de práticas que promovam a diversidade de culturas e a preservação da biodiversidade agrícola.
Certificação e rastreabilidade
Estabelecer e promover programas de certificação agrícola e rastreabilidade que garantam a qualidade dos produtos e o cumprimento de padrões socioambientais.
Incentivar a participação dos produtores em iniciativas de certificação sustentável, como o selo Rainforest Alliance ou o programa Fair Trade.
Educação e conscientização
Implementar programas educacionais para agricultores, extensionistas e comunidades rurais, promovendo práticas agrícolas sustentáveis e a compreensão dos impactos ambientais.
Sensibilizar os consumidores sobre a importância de escolhas sustentáveis, favorecendo produtos provenientes de práticas agrícolas responsáveis.
Participação e diálogo
Incentivar a participação ativa de partes interessadas, incluindo agricultores, comunidades locais, ONGs e setor privado, no desenvolvimento e implementação de políticas agrícolas.
Promover o diálogo entre diferentes partes interessadas para encontrar soluções colaborativas e equilibradas.
A resolução desses problemas exige uma abordagem colaborativa e a implementação coordenada de políticas que considerem tanto a sustentabilidade ambiental quanto as necessidades socioeconômicas das comunidades rurais. Essas estratégias podem variar de acordo com as características específicas de cada região, destacando a importância de abordagens adaptadas aos contextos locais.
Dois cenários, uma escolha
Considerando as características da economia brasileira e do agronegócio brasileiro, podemos esquematicamente imaginar dois cenários opostos, para fins de reflexão:
Cenário 1: presença de apoio governamental por meio de políticas públicas de incentivo ao desenvolvimento e providências para resolver problemas existentes;
Cenário 2: insuficiência de apoio governamental por meio de políticas públicas de incentivo ao desenvolvimento e providências para resolver problemas existentes.
Cenário 1: com apoio governamental
Neste cenário, o agronegócio brasileiro conta com um forte apoio governamental por meio de políticas públicas bem estruturadas para incentivar o desenvolvimento sustentável e abordar questões críticas. Algumas características deste cenário podem incluir:
Incentivos à sustentabilidade
Políticas que incentivam práticas agrícolas sustentáveis, como agricultura de precisão, agroecologia e sistemas agroflorestais. Isso incluiria programas de subsídios e incentivos fiscais para práticas que reduzem o impacto ambiental.
Investimentos em infraestrutura rural
Fortes investimentos em infraestrutura, como estradas, armazéns e sistemas de irrigação, visando melhorar a logística e a eficiência na produção e distribuição.
Desenvolvimento tecnológico
Apoio significativo à pesquisa e desenvolvimento de tecnologias agrícolas avançadas, visando aumentar a produtividade, reduzir os custos de produção e promover a inovação no setor.
Programas de crédito agrícola
Linhas de crédito acessíveis e favoráveis aos agricultores, promovendo investimentos em maquinário moderno, tecnologias e práticas sustentáveis.
Inclusão social e agrícola familiar
Políticas que buscam promover a inclusão social, garantindo que pequenos agricultores e a agricultura familiar tenham acesso a recursos, assistência técnica e mercados.
Regulamentação ambiental efetiva
Implementação e fiscalização rigorosa de regulamentações ambientais para conter o desmatamento, proteger ecossistemas sensíveis e garantir práticas agrícolas responsáveis.
Diversificação de culturas
Estímulo à diversificação de culturas e rotação de culturas para melhorar a resiliência dos sistemas agrícolas e reduzir a dependência de monoculturas.
Cenário 2: sem apoio governamental
Neste cenário, o agronegócio não conta com um apoio governamental eficaz, o que resultaria em desafios de crescente complexidade e impactos negativos para o setor. Algumas características deste cenário podem incluir:
Falta de incentivos à sustentabilidade
Ausência de políticas que incentivem práticas agrícolas sustentáveis, o que pode levar a práticas não ambientalmente amigáveis e aumento dos impactos negativos.
Infraestrutura insuficiente
Falta de investimentos em infraestrutura rural, resultando em dificuldades logísticas, aumento dos custos de transporte e menor eficiência na distribuição de produtos agrícolas.
Limitações à pesquisa e desenvolvimento
Baixo investimento em pesquisa e desenvolvimento, resultando em uma falta de inovação, baixa produtividade e uma posição menos competitiva no mercado global.
Restrições ao crédito agrícola
Dificuldade no acesso ao crédito para os agricultores, limitando sua capacidade de investir em tecnologia, modernização e práticas agrícolas sustentáveis.
Exclusão social e obstáculos à agricultura familiar
Falta de políticas focadas na inclusão social, resultando em desfavorecimento da agricultura familiar e pequenos produtores, o que pode levar a um aumento da desigualdade.
Regulamentação ambiental fraca
Ausência de regulamentação ambiental eficaz, resultando em práticas agrícolas prejudiciais ao meio ambiente, incluindo o desmatamento descontrolado.
Monocultura e dependência
Propensão à menor variedade de culturas devido à falta de incentivos para diversificação, o que pode tornar o setor mais suscetível a pragas, doenças e choques de mercado.
A diferença entre estas duas situações aponta a importância de políticas públicas cuidadosamente elaboradas para impulsionar o desenvolvimento sustentável do agronegócio. O primeiro deles destaca como o respaldo governamental pode ser um catalisador para que tenhamos um setor agrícola mais resiliente, competitivo e inclusivo socialmente, proporcionando não apenas estabilidade econômica, mas também fomentando práticas inovadoras e sustentáveis. Em contrapartida, o cenário alternativo destaca os desafios iminentes associados à ausência de tais políticas.
A decisão entre esses caminhos não apenas moldará o panorama econômico nas próximas décadas, mas também reverberará em diversas dimensões da vida social. Questões como a eficácia das instituições, a qualidade de vida da população e a consecução de objetivos sociais fundamentais — incluindo-se aí a redução de desigualdades e o estímulo ao bem-estar social — estarão fortemente atreladas a escolhas que forem feitas em relação ao agronegócio. Da mesma forma, a promoção de práticas responsáveis e a busca por soluções que integrem aspectos econômicos, sociais e ambientais emergem como imperativos para garantir um futuro sustentável e equitativo.
Escolhas como estas dependem de que haja discernimento, imaginação, boa vontade, espírito de luta e capacidade de pensar com horizonte prospectivo. O futuro nos dirá se tais ingredientes estarão presentes no enfoque dos formuladores de políticas e na capacidade de mobilização das pessoas envolvidas.
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José Luís Neves é profissional da área de controladoria e planejamento. Economista e administrador com mestrado em Administração pela USP, possui mais de 25 anos de experiência em empresas de consultoria e serviços, onde tem sido responsável por atividades de gestão financeira, orçamentação, contabilidade e custos. Reside em São Paulo (SP).
Co-Founder e CEO IAssist Tecnologia
11 mParabéns José Luís, outro excelente artigo. Como em toda a boa análise estratégica, o texto aponta um caminho e indica o quê, quem, como, quando, onde e quais são as fontes de recursos. Abraço!