#NewNow e o Direito
Em artigo que publiquei na Revista Você S/A em dezembro de 2012, no qual tratei do novo perfil do advogado, um dos aspectos que trouxe para reflexão foi a tendência de escritórios de advocacia disporem em suas equipes de advogados, executivos responsáveis por gerenciar profissionalmente suas atividades e negócios. Destaquei também que as faculdades de Direito, em sua maioria, não contribuíam para que seus estudantes desenvolvessem competências consideradas importantes pelo mercado para o exercício da profissão, tais como: facilidade para encontrar informação de qualidade (lidar com acesso x excesso), capacidade de prevenir e resolver problemas (com pensamento crítico), ser proativo e ter uma boa rede de relacionamentos (networking). Além disso, desenvolver formação interdisciplinar, ter visão de negócios, desenvolver pensamento empreendedor e estratégico e atuar como verdadeiro gestor de assuntos jurídicos, eram à época temas de vanguarda.
E hoje, como estamos? Acredito que persista a demanda do mercado por profissionais com perfis diferenciados, multidisciplinares e, obviamente, ambientados às novas tecnologias. E, que competências são mais demandadas em tempos de transformação digital, quando novos desafios e oportunidades se abrem à carreira jurídica e seus efeitos já são perceptíveis no ambiente dos negócios, na sociedade e no meio acadêmico?
O ambiente atual é propício ao desenvolvimento de novos negócios e o advogado conectado pode enxergar nesse movimento janelas de oportunidade para diversificar sua atuação profissional, seja para assessoramento técnico mais refinado, seja para ele próprio, se assim desejar, empreender. Por exemplo, no Brasil o número de Lawtechs – startups voltadas ao mercado jurídico tem aumentado consideravelmente e muitas funções antes realizadas apenas por advogados têm sido automatizadas, por razões diversas, mas que na visão de seus defensores tem o objetivo de incrementar sua eficiência, rapidez e, por conseguinte, reduzir custos ao cliente.
Em recente artigo com o título “Why ´worthless´ humanities degrees may set you up for life”, publicado em 02/04/2019, a jornalista Amanda Ruggeri, da BBC Inglesa, comentou que a despeito da percepção atual de que no mercado de trabalho haja maior procura por profissões, no que usualmente denominam de “Stem” (sigla em Inglês para “ciência, tecnologia, engenharia e matemática”), uma pesquisa conduzida pela plataforma Linkedin no Reino Unido, com foco nas habilidades de trabalho mais procuradas pelos empregadores para 2019 revelou que as três primeiras soft skills mais procuradas são “criatividade”, “persuasão” e “colaboração” (seguidas de “adaptabilidade” e “gerenciamento de tempo”), enquanto que uma das cinco principais hard skills é a “gestão de pessoas”. Além disso, mencionou que em um estudo de 2017 realizado nos EUA pela National Bureau of Economic Research descobriu-se que os empregos que mais cresceram lá nos últimos 30 anos exigiam quase todos níveis específicos dessas habilidades mais sociais.
Em um artigo “Desenvolvendo profissionais para o futuro”, de Ana Paula Morgado e Ana Luiza Pliopas, publicado em 2018 na Revista GV Executivo, esta tendência foi também noticiada: “[...] A digitalização, a automação e os avanços nas tecnologias de inteligência artificial trarão mudanças significativas e disruptivas ao mundo do trabalho, fazendo, por um lado, desaparecer profissões que podem ser facilmente automatizadas, por outro, criando novas atividades...As funções menos impactadas serão as que a tecnologia não conseguirá, ainda, imitar ou superar o desempenho humano. [...]as competências com mais valor serão aquelas que envolvem os chamados soft skills”.
O ecossistema atual oferece uma miríade de possibilidades de atuação legal e o mercado tem exigido do advogado cada vez mais um perfil multidisciplinar e competências, que geralmente fogem à sua formação tradicional. Assim, agregar habilidades de outras áreas do conhecimento é considerado um importante diferencial na profissão e, quando possível, recomenda-se ter uma experiência internacional de trabalho ou de estudo que também contribua para o desenvolvimento de importantes soft skills (habilidades sociais), tais como, habilidades de comunicação (inclusive corporativa), liderança, compreensão cultural, empatia (compreensão das necessidades e desejos de um grupo diversificado de pessoas), curiosidade e gerenciamento de projetos etc.
Por fim, já há indícios de um novo movimento chamado de “steam”, que seria a sigla “stem” acima mencionada acrescida de “a” para “artes”, incluindo aí conceitos de design para inovação, pensamento crítico e abordagens criativas para solução de problemas do mundo real.
Assim, sugiro aos leitores uma reflexão. Diante destas questões, como vocês profissionais do direito, incluindo aí estudantes e futuros advogados, têm se preparado para tais desafios e novas tendências que eventualmente caracterizarão o futuro “pós-digital”?
Fiquem à vontade de expor sua opinião ou de tecer algum comentário abaixo.
Regional Head of Legal & Regulatory Affairs - Latin America @ Booking.com | Master of Laws | FGV law professor
3 aBelo artigo Rafael. Compactuo com sua opinião. O mundo jurídico está evoluindo e estamos todos contribuindo para moldar o afamado “tomorrow’s lawyers”. Abs
Eletricitario
5 aObservem que as habilidades sociais e multidiciplinares compiladas pelo Professor ,não são exigências somente de mercado .Muito mais amplo ,antes são requisitos humanos para as boas relações em qualquer ambiente...Podemos inclui-los aos bens difusos não sujeitos a compra e venda. Independente do mercado ,mas o sustenta.
Advogada Corporativa | Direito Coletivo do Trabalho e Relações Sindicais na Vital Engenharia Ambiental (Grupo Queiroz Galvão)
5 aExcelente reflexão. Hoje o profissional do Direito tem que ser, mais do que um "código ambulante", um parceiro do negócio, participando das decisões estratégicas e mapeando riscos.
Advogada e Sócia Fundadora da Batista & Filippi Advocacia.
5 aÉ o que tenho estudando e, inclusive, me levou ao MBA em Business Law da FGV. Como professora, tenho advertido aos alunos que o estudo para decorar ler, para pensar dentro da caixa e acreditar que existe apenas uma resposta certa fará deles apenas profissionais não prestigiados no mercado futuro (não tão futuro assim já que no meu escritório, que é pequeno e conta com apenas 2 sócios e 2 associados, já trabalhamos com IA). As recentes alterações legislativas e toda tecnologia a nossa volta tem colocados os advogados em pés de igualdade. A experiência profissional divorciada de atualização pelo profissional não é garantia da permanência deste no mercado de trabalho. Todos devemos que repensar nossas condutas!