O temido retorno da licença maternidade

O temido retorno da licença maternidade

Sempre tive o sonho de ser mãe.

Eu e meu marido estamos juntos há 16 anos, e desde sempre, eu soube que queria formar uma família com ele. Nos casamos em 2014, e devido a minha situação profissional fomos adiando esse sonho para que pudéssemos realizá-lo em um momento de maior tranquilidade em minha vida.

Desde que me casei, passei por duas empresas, e em nenhuma delas eu me imaginava sendo mãe, pois eu tinha certeza que sofreria muito por estar em instituições que não valorizavam e não respeitavam mulheres após a maternidade. Em uma destas, vi inclusive, mães sendo dispensadas logo após a volta da licença.

Sempre que batia a vontade de ter filhos, eu me forçava a buscar um caminho diferente para sair daquela situação infeliz de trabalho, isso foi algo que sempre me moveu.

O tempo passou, e depois de adiar diversas vezes, engravidei no melhor momento possível, trabalhando com o que gosto, na minha empresa, fazendo meus horários, e podendo me dedicar ao meu sonho de ser mãe sem deixar de ser uma profissional respeitada no ambiente de trabalho (no caso, respeitada por mim mesma que sou minha chefe rsrs).

Mas olho ao redor, e vejo na maioria das mães que retornam ao trabalho, tudo aquilo que eu sempre tive medo de que acontecesse comigo: empresas que não tem um mínimo de empatia com essas mães que passaram por tanto para gerar uma vida, mulheres que aos 6 meses ainda estão enfrentando um puerpério, que estão com privação de sono, que a memória ainda não está lá essas coisas, que muitas vezes não tem uma rede de apoio, e ficam constantemente exaustas. E ver isso me traz a tristeza de viver em uma sociedade que não valoriza e nem respeita mulheres, principalmente quando se tornam mães.

Cada mulher passa pela gestação, parto, puerpério de uma maneira e isso impacta em sua vida. Eu, por exemplo, fiquei com a memória péssima e um pouco lenta (pra não dizer muito) e isso acaba abalando nossa confiança. Já ficamos inseguras no retorno pois algumas coisas mudam nesse período de ausência, se não temos um time que nos ajude a recuperar essa confiança e que respeite nossos limites momentâneos, fica muito mais difícil retornar.

E esses limites (quando existem) são momentâneos. Quando a mulher se torna mãe, ela não deixa de ser a profissional competente que era, não deixa de cumprir suas responsabilidades, não deixa de exercer nenhum dos papéis que tinha antes, pelo contrário , ela ganha mais um que é o de ser mãe. Essa mãe volta como uma profissional mais completa ainda, com mais habilidades que acaba tendo que desenvolver para driblar as dificuldades, e com mais força pra ir atrás de seus objetivos.

Pra te provar isso, eu sou destra e aprendi a comer comida japonesa com hashi na mão esquerda!!!! Se eu estou conseguindo fazer isso, o que uma mãe não consegue nessa vida?

Brincadeiras a parte, a maternidade traz consigo o desenvolvimento de habilidades que ajudam no ambiente profissional, como por exemplo:

  • Empatia: quando temos filhos deixamos de ser o centro de nossa atenção, e passamos a nos colocar no lugar daquele serzinho tão indefeso e identificar suas necessidades. Esse aprendizado acaba sendo levado para a vida.
  • Planejamento e organização: se não soubermos planejar muito bem, acabamos "engolidas" pela rotina e não conseguimos realizar nada além das atividades do dia a dia, nem mesmo cuidados pessoais mínimos.
  • Inteligência Emocional : o cansaço, a privação de sono e a rotina exaustiva podem fazer com que em alguns momentos possamos perder a paciência, nestes momentos acabamos exercitando nosso controle emocional.
  • Capacidade de Delegar: é impossível dar conta de tudo, cedo ou tarde "um prato acaba caindo" e aí se torna necessário pedir ajuda. Neste caso saber delegar, assim como na carreira, faz parte de uma jornada de sucesso.

Essas habilidades não são vistas pelas empresas porque, na maioria dos casos, funcionários são vistos como números e não como seres humanos, e as mulheres são menos notadas ainda. Precisamos que a sociedade passe a enxergar essas mães e a apoiá-las nesse retorno, a maioria das mães precisa fazer um retorno em um momento em que os bebês ainda são completamente dependentes, e o abalo emocional que isso traz não é respeitado pelos líderes, pelas equipes e nem pelas empresas.

É um problema estrutural, que levará tempo para ser resolvido. Hoje já temos empresas que fornecem um retorno mais flexível, outras que dão mais tempo de licença, empresas que tem espaços para as mães ordenharem seu leite, empresas com cultura de valorização dessas mulheres, empresas que fornecem licença paternidade(que afeta diretamente a qualidade do retorno das mães) de 20 a até 120 dias, mas ainda são poucas as empresas que fazem isso.

Só reclamar também não adianta, precisamos de ações, precisamos de iniciativa dentro das empresas. Não é fácil mudar a cultura, mas alguém precisa dar o pontapé inicial e trazer iniciativas que apoiem as mães, e façam com que esse período se torne mais leve pra essa mulher que já passa por tantas mudanças e dificuldades nesse momento. E essa pessoa responsável pelo pontapé inicial pode ser você que está lendo este artigo.

Uma mãe tem inúmeros motivos pra entregar um trabalho ainda melhor do que já entregava, mas precisa que seja vista e acolhida.

Hoje estou voltando a produzir conteúdo por aqui depois de me tornar mãe, hoje sou uma pessoa muito diferente de 7 meses atrás. Por aqui também bateu a insegurança, o medo de não conseguir escrever um artigo, ou de não ser boa o suficiente pra trazer qualquer mensagem pra você. O que me fez ficar insegura assim foi pensar que fiquei 7 meses "parada". Mas quando parei e pensei melhor, percebi que eu estava com uma percepção muito errada do período que passei.

Como assim parada? Foi mais de um ano de intensas transformações e aprendizados em minha vida, e hoje estou aqui mais forte do nunca. Todo tipo de evolução em nossa vida pessoal é refletida diretamente em nossa vida profissional, hoje eu tenho 7 meses a mais de experiência de vida sendo mãe. E isso meus caros, é muita coisa!

Hoje eu tenho uma razão maior pra ir atrás dos meus objetivos, e quero que todas as mães possam viver a maternidade com essa leveza, e sem tantos medos e inseguranças quando se pensa na volta ao trabalho.

Você que está lendo este texto e tem uma funcionária, colega ou líder que está voltando de licença maternidade, pode ser parte dessa mudança. Veja no que pode ajudar, como por exemplo:

  • Tentar entender as dificuldades que ela está passando e a ajudar a encontrar uma solução;
  • Flexibilizar seus horários nessa volta para que ela consiga conciliar todas as suas novas atividades;
  • Dar um tempo para que ela se reconheça novamente. A maternidade traz uma certa perda de identidade somada à adição de um novo papel para essa mulher. Deixe que ela, aos poucos, retome sua identidade.
  • Se a memória falhar, tente entender e ajudar no que puder, é passageiro.

Pequenas ações nesta retomada podem mudar o retorno e adaptação dessa nova mãe, e cada um de nós é responsável por isso. Faça sua parte, que com certeza será um bom passo para essa longa caminhada que precisamos percorrer.










 

Amei a forma como abordou esse tema, Ariella! Estou no meu último mês de gestação e já me identifico demais com os pontos abordados por você. Hoje tenho o privilégio de trabalhar em uma empresa muito humana e respeitosa, que me apoia nessa saída para licença-maternidade. Mas é difícil não se abalar pelas estatísticas do nosso país, além dos rótulos e preconceitos que a mulher e mãe carrega no mercado de trabalho, né?! Ótima reflexão!

KATIA DE SOUZA

Gestora de Recursos Humanos Nexialista

3 a

Muito bom!

Maite Ribeiro Gottsfrits

QA Lead - Quality operations and product disposition

3 a

Moro na Irlanda e meu retorno maternidade foi muito bom. Não tenho família por aqui e minha manager sempre se mostrou disposta a me ajudar no q fosse pra eu me reintegrar ao time. Sou contractor e meu contrato foi renovado durante licença maternidade. A mentalidade do empregador referente a licença maternidade aqui na Irlanda é bem diferente comparando com muitas empresas brasileiras. Meu filho ficou doente por 1 semana e minha manager me deu todo apoio do mundo. No primeiro mês de volta ao trabalho todos me perguntavam se eu estava bem lidando com noites mal dormidas e pra pegar leve na minha readaptação, enfim só tenho elogios a empresa e aos meus colegas.

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