PEC da Autonomia
Comentários sobre a PEC da Autonomia do Banco Central
Está tramitando no Congresso a PEC da Autonomia para dar mais autonomia financeira ao Banco Central. É uma iniciativa meritória. Uma moeda estável é condição necessária para o desenvolvimento do Brasil.
O Brasil está comemorando os 30 anos do Plano Real. Nesse tempo, a inflação acumulada foi menor do que nos seis meses anteriores a sua implantação. É um mérito. Para consolidar ainda mais o controle da inflação, foi concedido ao Banco Central autonomia operacional em 2021 e definiu-se que seu objetivo principal é atingir uma meta de inflação. Mas não é o único.
Também tem como objetivo a gestão da política cambial, executar e supervisionar os meios de pagamentos, determinar e recolher os depósitos compulsórios dos bancos, exercer o controle do crédito sobre todas as formas, efetuar o controle dos capitais estrangeiros, ser depositário das reservas internacionais, supervisionar o sistema financeiro, conceder e cancelar autorizações para funcionamento de instituições financeiras e regular a execução da compensação entre outros.
Conceder autonomia para a condução da política monetária não é o mesmo que conceder autonomia para todas as funções do Banco Central. Há outras consequências que devem ser analisadas.
A lei 4.595, que determina os objetivos do Banco Central comemora 60 anos. Nesse tempo, o sistema financeiro é outro, a tecnologia é outra, a economia é outra, o papel do crédito é diferente, enfim o Brasil se transformou. O Banco Central tem desempenhado bem algumas de suas funções, e é meritório por isso. Mas não tão bem outras, como no crédito e no câmbio. É oportuno pensar em readequações da estrutura institucional do sistema financeiro.
Outro comentário é que o Banco Central tem sua organização mais voltada para o funcionamento interno do que para sua função na economia. A exceção da política monetária as outras sete diretorias: administração, assuntos internacionais e gestão de riscos corporativos, fiscalização, organização do sistema financeiro e de resolução, regulação, relacionamento institucional e cidadania não estão focadas nos objetivos do Banco Central.
Há também ineficiências institucionais. Há uma superposição nas atuações do Banco Central com a da CVM – Comissão de Valores Mobiliários, criada em 1976, quando o mercado monetário e de capitais era segmentado. Não é mais. A mesma função é feita por duas instituições simultânea e independentemente. Há uma perda de foco e um aumento de custos de observância para o sistema.
Não há um mandato explícito que objetive assegurar uma oferta de crédito mais conscienciosa e competitiva. É imperativo, mais eficiência na concessão de financiamentos, na transparência e na proteção ao consumidor de produtos financeiros. Evitar-se-ia parte de estragos onde poucos agentes inescrupulosos deterioram a qualidade das carteiras e a imagem do sistema.
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Há mais de seis milhões de empresas e de setenta milhões de cidadãos negativados. A defesa do consumidor financeiro está dispersa entre a ouvidoria do Banco Central, dos próprios bancos e dos Procons. Sua concentração deveria dar-se em uma autarquia independente com poderes para regulamentar e punir, que teria como foco principal informações em boas práticas à todas as partes envolvidas. Pode-se pensar numa APCF – Autarquia de Proteção ao Consumidor Financeiro, com metas de acesso, de uso e de adimplência.
A gestão da política cambial é ineficiente. Ao invés de um regime de câmbio flutuante o país tem um regime de câmbio volátil. Ilustrando, no último mês a diferença entre a cotação máxima e mínima foi de 6,1% e neste ano de 14,8%. A volatilidade cambial tem efeitos nefastos nos setores industrial e agrícola. Urge debater como pode ser reformulada.
A política de crédito é passível de aprimoramentos e deveria ser debatida. A relação crédito do sistema financeiro/PIB está no mesmo patamar há uma década e na metade de outros países com o mesmo nível de renda que o nosso e que não tem a mesma sofisticação financeira que nós temos. Há alternativas.
Para uma autonomia maior da condução da política monetária, poder-se-ia pensar num spin off do Comitê do Política Monetária e numa mudança de sua composição. Atualmente é formado por diretores do Banco Central. Todos de alto gabarito, mas não necessariamente, especialistas em política monetária. É importante que os membros do comitê tenham garantia de inamovibilidade por um prazo determinado. Mas isso pode ser conseguido, sem que sejam necessariamente diretores do Banco Central. Podem ser membros com notório saber de outros órgãos do governo, da academia e até independentes.
Outras medidas para melhorar a governança da política monetária poderia ser aumentar a representatividade do CMN – Conselho Monetário Nacional, incluindo participantes do sistema financeiro e de outros setores empresariais no CMN, conforme sua concepção original em 1964. Contribuindo para uma normatização mais legítima e focada do órgão.
Outro spin off a se pensar é o da operação do PIX. Atualmente quem usa não paga seus custos e na estrutura atual ninguém supervisiona seus riscos. Há um princípio básico em finanças, chamado a primeira lei do bancário: “Um faz e outro supervisiona”. Deve ser observado.
Remover o entulho inflacionário do sistema financeiro melhoraria a atuação do Banco Central. Leia-se ajustes em bancos oficiais, crédito direcionado, moeda remunerada, indexação, liquidez, tributação e inadimplência, transparência, câmbio e concorrência. A multiplicidade de distorções é bizantina e aumenta a taxa neutra de juros.
É importante a autonomia para as demais funções do Banco Central. Não há necessidade que estejam concentradas numa só instituição. A autonomia é importante para que as funções que exerce cada instituição sejam do estado brasileiro e não de cada governo. Poder-se-ia também pensar na PEC das Autonomias, dando maior autonomia ao Ibama, à Anvisa, a Aneel e outros. Daria mais eficiência ao estado brasileiro.
Head de Trading de Crédito Local no Banco Safra. Professor no IBMEC. PhD em Finanças FGV-SP. Mestrado UNIFESP em Administração com foco em título previdenciário Tesouro RendA+.
5 mPerfeito Professor!