Vinhos com sobrenome

Vinhos com sobrenome

Um sobrenome muitas vezes pode dizer muita coisa a respeito de determinadas pessoas mas, se ele estiver sozinho pode não dizer nada, ainda mais se for um sobrenome extremamente comum de um determinado país. No Brasil, Silva é o sobrenome de maior frequência em qualquer lista telefônica , mas um Silva é completamente diferente de outro. Um pode ser Tércio Lins e Silva, grande jurista e defensor da democracia, ou Arthur da Costa e Silva, grande ditador – um mesmo sobrenome com qualidades bem diferentes.

Muitas regiões vinícolas desde a Grécia antiga adotaram sistemas de dar sobrenomes aos seus vinhos. Como sistema surgiu na era moderna como uma forma de proteger o produtor e o consumidor de falsificações a partir de uma campanha do Barão Le Roy, dono do Château Fortia na região do Châteauneuf-du-Pape, daí o sistema se espalhou por toda França e depois para outros países. Mais do que isso, resolveram determinar padrões mínimos de consistência na produção e, só os produtores e engarrafadores que seguem esses padrões tem o direito de utilizar esse sobrenome.

Esse sistema, chamado de denominação controlada, define que um determinado vinho foi produzido em (ou, no mínimo com uvas originárias de) uma região geográfica delimitada; que seguiu determinadas proporções na mistura de uvas – quando se trata de um vinho cortado - e que foi produzido seguindo métodos industriais comuns (tempo de fermentação, armazenamento dos sucos, tempo de envelhecimento em barris antes de ser engarrafado).

Esses sobrenomes você encontra com frequência em garrafas de diversas procedências. Da França vem os “appelation contrôllée” - são mais de 400 denominações. Da Itália (mais de 200) e Portugal os DOC – denominação de origem controlada (e em alguns casos da Itália além de controlada, também garantida - DOCG, onde o garantida significa que a uva foi plantada na área original da denominação). Na Espanha são os DO, em alguns locais dos Estados Unidos, AVA. Hungria e Bulgária tem sistemas similares. Além disso, quanto mais restrita geograficamente for a denominação do vinho, maior o rigor no controle do produto final e, na maioria das vezes, melhor o vinho. Observemos o caso da França para entender melhor isso :

Um vinho “appelation Bordeaux contrôllée” significa que o vinho pode ter sido produzido com uvas originárias de qualquer lugar do Bordeaux com regras menos ortodoxas quanto ao corte – é o vinho genérico da região. Mas dentro do Bordeaux existem sub regiões , Médoc, Graves, Lalande-Pomerol, etc. Portanto um “appelation Médoc contrôllée” já indica uma restrição quanto ao uso das uvas – que só podem ser originárias da sub-região que já costuma ter regras mais rígidas, até por que o controle é mais próximo. Mas o Médoc está dividido em Médoc e Haut-Médoc....e o Haut-Médoc, como as outras sub-sub-regiões está dividido em comunas como Pauillac, Saint-Estéphe, Saint-Julien....

O famosíssimo Château Mouton-Rothschild é um vinho produzido na comuna de Pauillac, portanto poderia usar as denominações de Pauillac, Haut-Médoc, Médoc e Bordeaux. Logicamente usa a denominação da comuna, que é mais específica e, portanto, tem mais prestígio. Seria o equivalente a dizer – se tivéssemos o mesmo sistema no Brasil – que o vinho Dal Pizzol, produzido na comuna de Monte Lemos, que é um distrito de Bento Gonçalves , que é uma cidade da Serra Gaúcha, que fica no Rio Grande do Sul, pudesse usar essas quatro denominações, optando pela que define melhor a sua procedência.

Isso não significa que todo vinho de denominação garantida é bom mas, se você tiver que escolher entre dois vinhos desconhecidos prefira sempre o que tem sobrenome. Entre dois vinhos de origem controlada, escolha preferencialmente o que usar a denominação mais restrita. O risco de errar nunca será zero mas diminui bastante.

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