The Walking Ad

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Acreditar que se está morto é uma doença neurológica rara.

Mas não tão rara assim na publicidade.

O Delírio de Cotard, nome dado em honra do neurologista francês Jules Cotard, consiste numa das mais mórbidas psicoses registadas na literatura. Os delírios de negação - como Cotard lhes chamou originalmente - vão desde a firme e inabalável crença por parte do indivídio de que perdeu órgãos vitais tais como o coração ou mesmo o cérebro, até à absurda realização de que está, de facto, morto.

Entre os casos estudados encontra-se uma mulher que obrigou a família a fazer-lhe um velório de caixão aberto enquanto a própria se queixava da decoração funerária, outra que insistiu para que a levassem para a morgue para poder “viver” com outros mortos, e até mesmo uma mulher que, pela constatação óbvia de que os mortos não precisam de comer, acabou por morrer à fome.

Seja qual for o bizarro desfecho, a doença implica que o indivíduo acredita que não devia existir. Muitos dos pacientes, quando confrontados com o facto de continuarem a pensar e falar apesar da sua condição fatal, afirmam que tal se deve a um qualquer misterioso erro de proporções cósmicas.

É um pouco assim para os criativos publicitários.

É comum a crença de se viver fora do tempo. Há quem ache que a criatividade, como a conheciamos, está morta. Seja pelos avanços tecnológicos, pelos retrocessos da crise ou pela mudança de paradigma de uma sociedade que se fartou de lenga-lengas e de clientes que perderam o respeito pela profissão.

Pensa-se que terminou a época dos conceitos, dos insights e das ideias bonitas só porque sim. O que interessa é despachar, fazer qualquer coisa só para inglês ver (de preferência uma app, não precisa de fazer sentido, só tem de ser trendy, techy e ter muitas outras palavras anglo-saxónicas). Vivemos num mundo pós-apocalíptico e os que cá ficaram na área é só por erro, teimosia ou atraso.

Verdade ou não, apesar de tudo cá estamos nós. Dia após dia a desafiar as leis da vida e da morte.

É que quanto mais as coisas mudam, mais elas ficam na mesma. Desde sempre que a humanidade precisou de artistas. De contadores de estórias. De pessoas que inspiram, que fazem pensar ou que simplesmente fazem rir. Por isso se os tempos mudam, mudemos com eles. E mudemos por nós próprios o que pudermos mudar. Porque como disse outro francês, “nada se perde, tudo se transforma”.  

A criatividade publicitária morreu. Longa vida à criatividade.

 

Mais disto no Pubsicólogo.

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