Incentivo à Capitalização das Empresas em 2023 … não, só em 2024!
Não sei se sou eu quem já não percebe nada disto! Provavelmente será, pois, com quase 40 anos de advocacia, e outros tantos orçamentos depois, é natural que nem tudo me seja imediatamente intuído como o conseguem mentes mais frescas e iluminadas.
Vem isto a propósito do novel e elogiado benefício a que se decidiu chamar Incentivo à Capitalização de Empresas que visou, nomeadamente, ocupar o lugar da Remuneração Convencional do Capital, ambos com o propósito de minimizar o chamado debt-equity bias, isto é, os comportamentos fiscais seletivos na escolha do modelo de financiamento das empresas entre reforçar o capital próprio, sem retorno fiscal, ou recorrer a capitais alheios, de sócios ou terceiros, com dedutibilidade dos juros na base tributável do imposto sobre o rendimento.
A ideia do Governo até parecia boa e interessante para as empresas: embora se diminuísse o valor da dedução ao rendimento tributável de 7% para 4,5% (5% para as micro, pequenas, médias empresas e small mid cap) do aumento líquido dos capitais próprios, ampliava-se o período da dedução para 9 anos e aumentava-se o limite da dedução possível (anteriormente limitada a 2M€ de aumento dos capitais próprios, agora a própria dedução limitada ao maior entre 2M€ e 30% do EBITDA fiscal).
E o regime com estas novas roupagens aplicar-se-ia aos aumentos dos capitais próprios verificados nos períodos de tributação com início em 1 de janeiro de 2023 ou a partir dessa data, isto é, já em 2023.
Mas eis que na nebulosa das mais de 1.800 propostas de alteração ao OE'2023, uma surge, pela mão do partido que suporta o Governo, que tudo vem alterar. É assim que, embora com uma nota justificativa totalmente desconforme com o texto da proposta de alteração, reveladora do cuidado que nela foi colocado pelos parlamentares proponentes, o novo regime passa ser substancialmente diverso. A saber:
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- O aumento dos capitais próprios relevante é o que se tiver verificado nos nove anos anteriores àquele em que a dedução tem lugar;
- Sendo que os nove anos se iniciam em 1 de janeiro de 2023.
Ou seja, como a norma ficou redigida após esta proposta de alteração na especialidade (obviamente aprovada pelo partido que a propôs), parece dever concluir-se que em 2023 não haverá benefício para ninguém. Só em 2024 as empresas poderão aproveitar o novo benefício desde que e na medida em que tenham registado um aumento líquido dos capitais próprios em 2023. E só neste já que eventuais novos aumentos líquidos dos capitais próprios no próprio período de tributação de 2024 só poderão ser considerados nos nove anos seguintes. Isto é, os aumentos dos capitais próprios registados em determinado período de tributação só são elegíveis para o benefício fiscal no período de tributação seguinte.
São estranhos os desígnios por detrás desta alteração e não quero crer que terá sido motivada pela redução da despesa fiscal associada ao benefício em 2023. Mas não deixa também de ser bizarro que a despesa fiscal de um benefício aprovado no OE'2023 venha a ser diferida para a conta do Estado de 2024!
Mesmo na redacção originária da medida constante da proposta inicial tenho dúvidas que não houvesse já o mesmo tipo de problema.
Árbitro em materia tributaria no CAAD na Centro de Arbitragem Administrativa de Lisboa
2 aIsso é o que diz a lei, Meu Amigo. Esperemos pelo que vão dizer os despachos de SEXA o SEAF!