Tantos algoritmos são mesmo necessários?

Tantos algoritmos são mesmo necessários?

Como praticamente todo o mundo, eu também me adaptei às plataformas digitais para escutar música.

Demorei, mas troquei meu hábito de portar CDs ou carregar o celular com canções em MP3 para escutar minhas bandas e artistas favoritos por meio de um serviço de streaming musical, que hoje faz parte do meu dia a dia.

No meu caso, o serviço é o Spotify. Já utilizei Deezer também por um tempo. Gostei de ambas plataformas.

Acontece que eu sou bastante metódico em relação à música. Era colecionador ávido de CDs e tinha orgulho de tê-los todos separados e organizados por gêneros e bandas. Com a adaptação ao Spotify, a vontade e o prazer de organizar as músicas foram supridas com as famosas playlists.

Tenho mais de 50 delas no Spotify e adoro a praticidade com a qual consegui colocar numa mesma lista diversas bandas que, antes, eu precisava garimpar nos meus arquivos (físicos ou digitais).

Entretanto, um serviço básico que eu costumava usar nos meus antigos players, por alguma peripécia do destino, ainda não conseguiu ser adaptado ao meio digital. Pelo menos não da forma correta.

Trata-se do Shuffle.

Também conhecido como "Modo Aleatório" ou "Random".

O conceito é simples.

Você escolhia o que queria ouvir e, caso quisesse alterar a ordem padrão das músicas, bastava ativar o Shuffle no seu aparelho. Voilà. Música de forma randômica tocando.

Este simples recurso, apesar de presente no Spotify, no Deezer e em qualquer outro serviço de streaming, aparentemente sofreu de um mau comum que acomete as big techs:

a síndrome do algoritmo desnecessário.

Como eu comentei, tenho um pouco mais de 50 playlists no Spotify.

Além, delas, tenho a lista mãe, que abraça todas elas. Minha obra-prima. Uma lista gigantesca que engloba todas, TODAS, as músicas que eu mais gosto.

Mas uma lista com mais de 1.200 músicas não seria nada sem um Shuffle para coroar sua existência.

E após dar o play com o Shuffle ativado na minha lista mãe pelo menos 100 vezes, ficou bastante evidente para mim que eu estava diante de um algoritmo intruso. Um invasor, atrapalhando algo que deveria ser a experiência mais simples e prazerosa do bom ato de ouvir música.

Eu sentia que o Spotify priorizava algumas músicas.

Meu incômodo foi tamanho com algumas canções que insistiam em aparecer na lista em detrimento de outras que jamais tocavam que ousei buscar no Google:

"Is Spotify Shuffle really random?" (O Shuffle do Spotify é realmente randômico?)

Eis que para minha não-surpresa me deparei com alguns artigos, como esse da The Tab em que eles tentam explicam o esforço da Spotify em criar um algoritmo que torne o Shuffle um modo aleatório, digamos, mais adequado a cada ouvinte.

Há até, acredite se quiser, uma petição no site de desenvolvedores do Spotify em que usuários como eu solicitam a possibilidade de simplesmente terem suas músicas embaralhadas de verdade e não manipuladas por algum algoritmo desnecessário que insista em otimizar a experiência do usuário. Um Shuffle básico. Original. Um algoritmo com apenas 1 linha de comando: tocar aleatoriamente.

Algo tão simples e fácil que talvez seja bom demais para existir.

Trata-se aqui de um dilema conhecido já por diversas empresas.

Justificar o uso.

Pagamos caro por um equipamento. Agora temos que usá-lo.

Contratamos um parceiro para fazer esses relatórios. Agora é preciso aproveitá-los.

Desenvolvemos uma linguagem de programação. Agora tudo tem que ser escrito nela.

O problema, porém, é que nem sempre o equipamento é realmente necessário. Nem sempre o parceiro faz o relatório que precisamos. Linguagens mais simples podem ser criadas. Em casos mais extremos, tais recursos mais atrapalham do que ajudam.

É o caso do algoritmo do Shuffle Fake do Spotify e para não ficar apenas nesse exemplo, vamos para o Youtube.

Faça um teste. Assista um vídeo de um canal desconhecido até o final. Em seguida clique que curtiu o vídeo e se inscreva no canal.

Pronto. Você acabou de destruir sua Home do Youtube.

A partir de agora ela será inundada com vídeos similares - alguns idênticos - ao que você acabou de assistir. Muitas das recomendações serão de canais que você não era inscrito e que vão acabar por ofuscar suas inscrições reais, das quais você se interessa de verdade. Para quê um recurso de se inscrever em um canal se você não vai conseguir acompanhar ele depois, devido à enxurrada de "novidades otimizadas para a sua experiência"?

Algoritmos são legais, não me entenda mal. Otimizar a experiência do cliente é um dever real das empresas.

Mas como todo recurso é preciso saber quando usar os algoritmos a seu favor e não apenas "justificar seu uso" empurrando-os em toda e qualquer interação.

Talvez seja o momento das big techs entenderem que, em alguns casos, basta deixar as pessoas à vontade. Basta deixar o modo aleatório seguir seu curso. E tudo bem.

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