Barreado ou Carne Barreada; prato paranaense cheio de histórias
Esse prato é preparado com um ou mais tipos de carne bovina, de segunda e magra, como paleta, maminha e patinho, temperada com cebola, alho, toucinho, pimenta-do-reino, louro e cominho, e cozida até desmanchar.
O barreado ou carne barreada é um prato típico do litoral paranaense, sendo o mais tradicional do estado.
Mas existem registros de que a sua origem é açoriana de um ritual de 300 anos ainda seguido no preparo do prato.
A origem é atribuída aos portugueses que vieram para o litoral do Paraná no século XVIII.
Os registros antigos indicam a vila de Guaraqueçaba (estado do Paraná) como a criadora da receita.
O tempero do prato seguiu junto com outras manifestações culturais para o continente, entre elas o fandango, dança de tamancos ao som da rabeca.
A simplicidade na preparação do prato garantiu que a receita fosse mantida com os mesmos ingredientes e características.
Uma das suas características é que mesmo requentado mantém o seu sabor, uma vez que é feito dentro de uma panela de barro pesada (Caldeirão de Barro), com tampa pesada do mesmo material, de barro, que é levado ao fogo sempre, para mantê-lo sempre super quente, perto de aproximadamente 100ºC.
Durante os dias de festa do fandango, o prato era reaquecido a cada refeição.
O sabor não se perde, pois o caldo grosso que se forma é que mantém o sabor da carne que se desmancha devido ao grande calor gerado pelo caldeirão tampado, com tampa pesada do mesmo material, sempre levado ao fogo e mantido nas labaredas, durante toda a festa.
Registro histórico brasileiro
O Barreado, por exemplo, é um prato emblemático do litoral paranaense, que fala do homem litorâneo, de sua história e de outras tradições que lhe são associadas. Entretanto, apesar de ser divulgado como prato típico do Estado do Paraná, em nenhum momento foi tratado ou divulgado como um prato representativo do estado como um todo.
O prato consiste em um ou mais tipos de carne bovina de segunda e magra, como a paleta, a maminha e o patinho, temperados com cebola, alho, toucinho de porco, pimenta do reino, louro e cominho e cozida até desmanchar.
O preparo é misturado à farinha de mandioca (até receber a consistência que dá nome ao prato), e servida com arroz e banana da terra fatiada.
A simplicidade na preparação do prato garantiu que a receita fosse mantida com os mesmos ingredientes e características.
Uma das suas características é que mesmo requentado mantém o seu sabor.
Durante os dias de festa do fandango, o prato era reaquecido a cada refeição.
O sabor não se perde, pois o caldo grosso que se forma é que mantém o sabor da carne.
O prato consiste em uma carne cozida, servida com arroz e farinha de mandioca.
O segredo na preparação é o tempo de cozimento na panela de barro, cerca de vinte horas, o suficiente para desfiar toda a carne.
Depois de cozida, as fibras da carne se soltam resultando em um caldo grosso e saboroso.
Para manter o sabor da carne, é preciso vedar a panela com uma massa de farinha e água, um barro preparado para manter o vapor dentro da panela.
Tradicionalmente o prato é acompanhado de frutas: bananas (com banana o gosto se completa) e laranjas.
Os locais tradicionais do Estado do Paraná onde encontra-se com facilidade o barreado são as cidades de Morretes, onde o prato é mais conhecido, porém também encontra-se nas cidades vizinhas: Antonina e Paranaguá.
O estudo da alimentação humana revela-se fascinante por permitir desvendar, a partir da análise de uma prática cotidiana, valores, significados e representações que muito dizem sobre os próprios grupos sociais.
Isso se torna possível na medida em que as decisões sobre a escolha, a produção, o armazenamento, a aquisição, o preparo e o serviço de alimentos são forjadas na própria cultura que dá substrato para a organização social, sendo norteadas por fatores objetivos (limitações impostas pelas técnicas de produção e poder aquisitivo, por exemplo) e simbólicos (significados atribuídos socialmente aos alimentos que podem resultar em valorações, positivas ou negativas, ou ainda proibições alimentares).
Marcadas pelos contextos socioeconômicos e tecnológicos nos quais se dão, tais determinações constituem – muito mais do que o exercício da preferência individual – um exercício do habitus do grupo e uma forma de reprodução, na microsfera cotidiana, dos condicionantes organizadores das sociedades.
Preparado no litoral paranaense, com a origem envolta em lacunas e contradições, o Barreado é uma iguaria feita à base de carne bovina cozida exaustivamente com condimentos, utilizando tradicionalmente como recipiente uma panela de barro hermeticamente fechada com goma de farinha de mandioca - técnica que inclusive batizou o prato.
Tem como características marcantes a textura e a apresentação da carne, praticamente desmanchando, que é servida com farinha de mandioca e banana.
Sua receita, disseminada por meio da tradição oral, possui variações principalmente no que se refere aos temperos adicionados à carne e à forma de preparo, variedade resultante da apropriação coletiva que contribuiu para a perpetuação desta tradição.
A importância do prato, entretanto, não se encerra na peculiaridade de seu preparo nem em seu sabor.
Mais do que uma iguaria gastronômica, o Barreado é uma manifestação intimamente ligada a outras práticas culturais litorâneas, presente na mesa dos autóctones nos domingos, em casamentos, batizados e aniversários, bem como nas festas comunitárias e religiosas, vinculada até hoje aos festejos do Carnaval e ao Fandango.
Símbolo de festa e fartura para as comunidades do litoral, o Barreado extrapolou o âmbito doméstico e alcançou a esfera comercial, sendo servido e degustado em larga escala em restaurantes de Antonina, Morretes e Paranaguá, principalmente a partir da década de 1970.
Observa-se que, embora várias fontes indiquem que o Barreado é preparado e degustado há mais de 200 anos em Guaraqueçaba, Guaratuba, Antonina, Paranaguá e Morretes, na atualidade são apenas os três últimos municípios que exploram o prato comercialmente, bem como têm sua imagem associada à iguaria.
Durante vários anos tais localidades disputaram entre si – e ainda o fazem, mesmo que de maneira velada – a paternidade do prato, e a titularidade da receita original ou do melhor Barreado.
Tais cidades, tão próximas geograficamente, possuem laços históricos que abrangem a ocupação territorial, a formação de sua população, além de vários aspectos socioeconômicos e culturais.
Até hoje é bastante comum encontrar famílias cujos membros se dividem entre Antonina, Morretes e Paranaguá, tornando-se fácil compreender os hábitos e tradições comuns, principalmente porque a ocupação humana da região se deu a partir da mesma base étnica.
A região, originalmente ocupada por índios pertencentes à grande família tupi-guarani, com predominância dos chamados carijós, recebeu durante muito tempo bandeiras preadoras de índios e indivíduos isolados que se arriscavam em busca de ouro, mas foi a descoberta de ouro na Serra Negra por Gabriel de Lara em 1641 que deu início ao seu povoamento efetivo.
As minas de ouro não apenas atraíram os primeiros povoadores brancos, como também lhes possibilitaram a existência durante quase um século no litoral e em certas regiões do planalto.
A caça, a pesca, os frutos silvestres e as roças de emergência foram a primeira fonte de subsistência desses homens de aventura.
Onde os grupos mineradores encontravam uma zona rica de aluvião aurífero, nela se instalavam demoradamente, constituindo os primeiros lares índio-europeus, mais ou menos estáveis, em que as roças iam surgindo e se multiplicando.
Assim, tal como ocorreu em Paranaguá, os primeiros desbravadores da região de Antonina, situada aos fundos da Baía de Paranaguá, foram faiscadores de ouro.
Em meados do século XVII foram concedidas três sesmarias nas encostas da enseada de Guarapirocaba (antiga denominação da Ilha Teixeira, estendida à enseada onde confluem o Nhundiaquara e outros rios menores, até ser ampliada para toda a baía de Antonina) a Antonio de Leão, Pedro de Uzeda e Manoel Duarte.
Por sua vez, os primeiros moradores de Morretes também foram aventureiros e mineradores, vindos de povoações e vilas paulistas por volta do ano 1646. Movida pela busca do ouro, a população da região foi se formando a partir de uma mescla de europeus (predominantemente portugueses), indígenas e negros escravos.
Em 1648, a aldeia de Paranaguá foi elevada à categoria de Vila e, no início do século XVIII, o povoamento da hoje chamada Antonina também começou a ganhar delineamentos mais definitivos, com o estabelecimento do capitão Manoel do Valle Porto em uma Ilha da baía de Guarapirocaba, em 1712.
A data oficial da fundação de Antonina é 12 de setembro de 1714, dia em que teve início a construção da Capela Nossa Senhora do Pilar, hoje conhecida como Igreja Matriz de Nossa Senhora do Pilar – origem da denominação popular dos moradores da localidade, vale dizer, de capelistas.
Contudo, diante da escassez da produção aurífera, da ausência de novas jazidas nas terras paranaenses e com o descobrimento das jazidas na região de Minas Gerais, a população local passou a se dedicar cada vez mais ao pastoreio.
Assim, o Tropeirismo iniciou-se a partir do deslocamento do eixo econômico da colônia ocasionado pela Economia do Ouro.
Tal atividade dinamizou o comércio local e contribuiu em muito para o desenvolvimento dos novos núcleos populacionais da região. Entretanto, tal crescimento deu origem a uma série de conflitos entre eles, especialmente Antonina, Morretes e Paranaguá, todos de caráter comercial.
Recomendados pelo LinkedIn
Uma das disputas se acirrou em 1761, quando o povoado de Pilar foi elevado à categoria de freguesia, que passou a se chamar Freguesia Nossa Senhora do Pilar da Graciosa.
Sua população reivindicou que a Estrada da Graciosa fizesse a comunicação entre o Planalto e o Litoral, o que era contrário à vontade dos Oficiais do Conselho de Paranaguá.
Nesta época, os capelistas recebiam oposição dos parnanguaras não só na frente administrativa, mas também religiosa: a briga entre os dois párocos das vizinhas freguesias só teve fim com a intervenção do prelado diocesano, Dom Frei Antonio Mercê de Deos.
O núcleo populacional da localidade hoje chamada Morretes ganhou contornos mais definidos quando o Capitão Antonio Rodrigues de Carvalho e sua esposa, moradores da região, conseguiram, em 1767, autorização para construir uma capela em homenagem à Nossa Senhora do Porto.
Posteriormente, o Rio Cubatão passou a ser percorrido obrigatoriamente pelos viandantes que de Curitiba desciam para o litoral pelo Caminho do Itupava; a partir da construção da capela o Porto Fluvial de Morretes começou a ter maior desenvolvimento. Os tropeiros que desciam de Curitiba para o litoral começaram a fazer suas compras no Porto de Três Morretes, tornando-se desnecessário deslocarem-se até Paranaguá.
O desenvolvimento criou um novo embate, desta vez envolvendo o núcleo de Morretes e a Câmara Municipal de Paranaguá, que, desejando impedir os prejuízos que seu comércio vinha sofrendo, proibiu, em 1780, a existência de casas de negócios secos naquela localidade.
Os comerciantes desta localidade apelaram da decisão para o governo de São Paulo e para a Junta da Real Fazenda, tendo obtido ganho de causa.
Embora seja um enfoque de pesquisa e discussão, pensar o Barreado como indutor do desenvolvimento e de grande pertinência, principalmente se analisada a realidade dos três municípios que o ofertam comercialmente: Antonina, Morretes e Paranaguá.
Estes municípios têm procurado no turismo o fortalecimento de suas economias, divulgando em suas respectivas ofertas turísticas elementos de seus patrimônios natural e cultural, como a gastronomia, o artesanato e os folguedos populares.
Comer não serve apenas para manter a máquina biológica do nosso corpo, mas também para concretizar um dos modos de relação entre as pessoas e o mundo, desenhando assim uma de suas referências fundamentais no espaço-tempo, a historiadora evidencia não apenas a íntima relação entre alimentação e cultura, mas também ressalta a complexidade da primeira.
As escolhas pertinentes à dieta alimentar extrapolam a manipulação de calorias digeridas e se estendem aos modos à mesa e aos locais e momentos em que a degustação ocorre, tem-se clara a gama de informações que podem ser depreendidas do estudo da alimentação.
Marcada por mudanças sociais, econômicas e tecnológicas, a alimentação humana demanda abordagens que não se fixem apenas em questões biológicas, tornando-a uma importante fonte de conhecimentos sobre determinados grupos humanos (abordagem comum dentro da antropologia) e também sobre determinado período histórico, não apenas no âmbito do que era consumido e com quais técnicas de preparo, mas também como reflexo de fluxos migratórios, representações ligadas ao alimento e a própria estruturação da economia, no que tange à produção e troca de produtos.
O historiador Henrique Carneiro afirma: - o costume alimentar pode revelar de uma civilização desde a sua eficiência produtiva e reprodutiva, na obtenção, conservação e transporte dos gêneros de primeira necessidade e os de luxo, até a natureza de suas representações políticas, religiosas e estéticas.
Os critérios morais, a organização da vida cotidiana, o sistema de parentesco, os tabus religiosos, entre outros aspectos, podem estar relacionados com os costumes alimentares.
Outras polêmicas sobre a origem do prato
Enfim, existe muita polêmica sobre como o Barreado conquistou os moradores do Paraná, ou como chegou ao Brasil.
Muitos acreditam na história do Barreado que se relaciona ao Entrudo, tradição que deu origem ao Carnaval. Afinal, é bem mais divertida e tem mais aceitação entre os historiadores!
A origem da fama do prato tem muitas versões, e uma delas é a de que era um prato famoso entre os tropeiros.
Muitos não acreditam nessa origem, já que fazer o Barreado exige longo tempo e o preparo e indicado para ser feito em panelões de barro, e isso é algo que dificultaria o transporte em cima de mulas.
Mas há também registros orais de que a receita do Barreado, que é muito simples e ao mesmo tempo exótica, que surgiu entre os caboclos das encostas da Serra do Mar, no litoral do Paraná, ainda no período colonial.
Um registro antigo faz referências em Portugal, datadas de 1252, sobre um preparado bem parecido.
Prato de longa preparação e preparado nas festas populares
O segredo na preparação é o tempo de cozimento na panela de barro, cerca de vinte horas, o suficiente para desfiar toda a carne e mantê-lo no fogo sempre.
Depois de cozida, as fibras da carne se soltam resultando em um caldo grosso e saboroso e temperado a gosto regional.
Para manter o sabor da carne, é preciso vedar a panela com uma massa de farinha e água para manter o vapor dentro da panela (Caldeirão).
O aguardente pode ser servido como aperitivo, sendo o vinho a bebida tradicional para o acompanhamento do prato; uma boa opção para quem não consome bebidas alcoólicas é o suco de uvas.
A brincadeira do Entrudo no século XVIII
O Entrudo era festejado durante três dias com muitas brincadeiras.
Por exemplo: pessoas jogavam uma nas outras farelos de pão ou polvilho, bacias de água, frutas e até mesmo terra.
Era uma farra intensa que necessitava de um alimento que garantisse muita energia para encarar as brincadeiras que facilmente acabavam em confusão.
E o Barreado supria, e ainda supre, muito bem esse objetivo e necessidade. Carne + arroz + farinha de mandioca + banana = energia de sobra.
As características da receita tornaram o prato ideal para ocasião, três dias em que as pessoas não faziam outra coisa senão dançar o fandango e comer, e não precisavam se preocupar com a cozinha: demandava poucos ingredientes, sendo relativamente barato; era fácil de ser feito e podia ser preparado com antecedência; conservava-se por um bom período de tempo e, mesmo requentado, não perdia o sabor original.
Além disso, por tratar-se de uma receita altamente calórica, o Barreado era, também, ideal para dar energia aos foliões.
Diz uma lenda que os caboclos dançavam dia e noite durante toda a festa sem se deixar abater pelo cansaço.
Quando não aguentavam mais, comiam Barreado acompanhado de farinha de mandioca seca e voltavam à farra ainda mais animados.
A bebida pouco fazia efeito frente à energia que obtinham quando se alimentavam de Barreado.
Com o tempo, o Barreado foi tomando mais fama e passou a fazer parte da cultura paranaense não apenas durante o Entrudo/Carnaval, e a procura pelo barreado no litoral desenvolveu o turismo gastronômico.
Dificuldade de popularização
Somente no início dos anos 70 foi que esta delícia da culinária artesanal paranaense ganhou status, passando a fazer parte do cardápio de sofisticados restaurantes de importantes cidades do Estado do Paraná.
A grande dificuldade para a massificação do Barreado é o seu tempo de preparação e cozimento, um ritual que pode levar de 16 a 24 horas.
Muitas receitas foram adaptadas para reduzir este tempo, usando a pressão.
O resultado agrada a muita gente, mas os puristas, afirmam que o sabor peculiar do prato fica alterado.
Nas festas típicas portuguesas que acontecem no litoral de Santa Catarina, o Barreado, também, é bastante consumido.
Segundo os apreciadores, este é um prato para ser saboreado aos poucos, devagar, sem a menor pressa.
Seu sabor é especial e inconfundível.
Desejo aos meus leitores uma ótima Terça Feira!!
Master degree and PhD student in Cultural Sciences / Food, Wine and Travel Writer/ Fiction Writer.
3 aé uma delícia!!!