Quando 'employee experience' é mais importante que 'customer experience'
Confesso que quando li pela primeira vez essa frase tive que duvidar um pouco. Quando falamos sobre transformação digital, 'customer experience' virou um mantra que poucos ousam em discordar. Porém, Dra. Kristine Dery, pesquisadora do MIT, argumenta em sua brilhante palestra que o espaço de trabalho e as experiências que temos nele são fundamentais para determinar o sucesso e o fracasso de uma transformação digital. Segundo ela, para que empresas possam se transformar e inovar elas precisam cuidar de dois pilares fundamentais que impactam diretamente na experiência dos funcionários:
Employee Connectedness: foco na comunicação digital e física
Responsive Leadership: foco em liderar novas normas comportamentais
Eu tive a oportunidade de trabalhar no Google por quase 3 anos, uma empresa conhecida pelos benefícios que dá para seus funcionários (e sim, com muita comida de graça).
O que eu aprendi trabalhando lá, e que compartilho com exemplos nesse texto, é como o foco nesses dois pilares é capaz de facilitar uma constante transformação digital onde o engajamento dos funcionários cria um ambiente de alta performance e inovação.
O espaço é somente parte da resposta
Segundo Dery, não existe correlação em redesenhar espaços de trabalho e performance. Empresas investem em reformar seus escritórios para que eles pareçam mais cool e jovens, mas mantém a mesma estrutura onde as pessoas continuam presas às suas mesas a maior parte do tempo. O 'Building 20' do MIT, um prédio onde a universidade promovia pesquisas sobre tecnologia, era conhecido por todos como um prédio escuro e com mofo, um ambiente nada moderno e convidativo. O que levou então o espaço a ter 9 pessoas ganhando Prêmio Nobels por pesquisas realizadas durante sua estadia nesse mesmo prédio? Ele era um espaço flexível, que foi construído de uma forma que a troca e a colaboração pudessem acontecer de maneira fluída. E é assim que empresas como Google investem em espaços como micro kitchens, pequenas cozinhas espalhadas pela empresa onde pessoas podem trocar ideias e se conhecer. A empresa também promove eventos descontraídos, como 'drinks depois do trabalho', para criar momentum para que as conexões sejam feitas sem o peso que a palavras 'networking' traz. Muitas das conexões que fiz quando trabalhei lá, assim como projetos e ideias novas surgiram de encontros pelas áreas comuns do Google.
Algumas empresas já usam espaços como coworkings, onde a diversidade de pessoas e áreas de conhecimento, somados à um espaço descontraído com sofás, mesas comunitárias e áreas comuns potencializam essa troca.
Leia mais nesse artigo da Harvard Business Review.
E o que é 'espaço de trabalho' afinal?
Quando falamos sobre 'espaço de trabalho' é preciso considerar não só o espaço físico, mas também as tecnologias envolvidas em como times se comunicam e exercem o seu trabalho, além da cultura, comportamentos, e formas de liderança envolvidas no dia a dia. É em torno disso que empresas precisam desenvolver e melhorar constantemente seu 'Employee experience'.
Employee Connectedness: Performance está relacionada com como seus funcionários se conectam
Empresas de alta performance potencializam a forma que seus funcionários se conectam para que eles possam engajar uns com os outros para trocar e gerar conhecimento, informação e ideias. Segundo Scott Birnbaum, vice presidente da Samsung, 'As ideias mais criativas não vão surgir enquanto você está sentado na frente do seu computador'. 'Employee experience' acontece quando você cria formas de empoderar as pessoas da sua empresa para que elas se conectem. Veja três formas de fazer isso:
Através de sistemas que funcionam:
Já ouvi empresas falando como elas estão tentando liderar uma transformação digital e colaboração enquanto a área de IT da empresa cria mais barreiras do que formas de colaborar. O medo de que informação sigilosa seja compartilhada indevidamente no mercado faz com que empresas criem silos de informação. Elas bloqueiam sites de compartilhamento, redes sociais, ferramentas de cloud como Google Drive e Dropbox, trabalham com sistemas ultrapassados de email e mensagem, e desencorajam seus funcionários a buscarem soluções tecnológicas diferentes para seus problemas. E depois de criarem todas essas barreiras, pedem para seus funcionários compartilharem conhecimento e trabalharem colaborativamente.
Empresas precisam tratar seus funcionários como adultos no que diz respeito à responsabilidade que os mesmos possuem diante das formas de se trabalhar. No Google eu e todos os funcionários tínhamos acesso à informações extremamente sigilosas, podíamos inclusive testar produtos que o mercado só iria saber um ano mais tarde, além de trabalhar com toda a informação na nuvem. Não eram os sistemas e barreiras que impediam as informações de 'vazarem', mas sim a percepção das pessoas de que elas eram 'guardiãs' dessa informação.
Times precisam dos sistemas e ferramentas certas para trabalhar colaborativamente e compartilhar conhecimento. Empresas como Slack, G-Suite, Microsoft 360, e Facebook Workplace vem revolucionando isso.
Social Media pode empoderar seus funcionários:
Nós somos seres sociais por essência. Porém, como engajar os seus funcionários nas conversas corporativas e compartilharem ideias através de diferentes unidades de negócio e hierarquias?
Esqueça a era dos emails. Nada mais formal que se apresentar e começar uma conversa usando uma mensagem que irá se tornar mais uma na caixa de entrada cheia do dia a dia. Convidar e engajar mais pessoas para participarem nessa conversa se tornaria mais difícil ainda.
Slack, ferramenta de mensagens e colaboração online, cresceu exponencialmente nos últimos meses pois entendeu isso. Com o site você pode criar grupos de conversa e compartilhar com seus membros links, ideias, e reações com emoticons. Um bot com um tom de voz humanizado serve para organizar as conversas, selecionar os pontos mais importantes, e ajudando a fazer buscas por assuntos que você gostaria de resgatar em conversas passadas. Na mesma plataforma pessoas diferentes, de lugares diferentes, em timezones distintas, podem se comunicar e colaborar necessitando somente de acesso à internet. Outro exemplo é a nova ferramenta de colaboração corporativa online do Facebook chamada Workplace. Com o desafio de conectar e criar uma grande comunidade de gerentes e funcionários de lojas, Starbucks possui cerca de 80% do seu staff usando semanalmente a plataforma para se comunicar e trocar ideias.
Empresas precisam replicar a forma que interagimos socialmente nas ferramentas corporativas.
No Google, por exemplo, todos os funcionários podem criar e participar de grupos online onde compartilham o que quiserem. Desde que quem quer comprar a geladeira do Zé que está se mudando, até um projeto que precisa de pessoas para colaborar. O uso dessa ferramenta é escolhido pelos usuários, que co-criam sua finalidade.
'Social Media' corporativa não precisa ser algo complexo. Precisa ser algo que ajude os funcionários a se conectarem e quebrarem as barreiras de comunicação entre times.
Quando o espaço faz diferença:
Os espaços precisam ser desenhados para as pessoas se conectem ao invés de criarem silos organizacionais. Algumas empresas já estão investindo em espaços sem mesas fixas e com layout redesenhado, onde você pode sentar cada dia do lado de uma pessoa diferente, facilitando o encontro com colegas que você normalmente não conversaria. Sala privada para diretores e gerentes? Isso é algo do passado. Para quebrar o 'muro' que muitas vezes existe por causa da hierarquia, líderes precisam sentar junto com o 'chão de fábrica'.
O lugar que nos sentimos mais confortáveis (geralmente) é a nossa casa, né? Por que não podemos nos sentir acolhidos no nosso trabalho também? Empresas que investem em espaços comuns no escritório, como cafeterias, sofás e salas descontraídas onde os funcionários podem 'quebrar' um pouco a rotina e se reunir para trocar ideias, estão criando na verdade um ambiente de alta performance. Há quem diga que o Googleexagera oferecendo tantos benefícios e um ambiente até descontraído demais. Eu discordo. Trabalhando lá por tanto tempo posso dizer que o ambiente estimula não só a criatividade como também uma cultura de colaboração e inovação constante.
Responsive leadership: Líderes como facilitadores da mudança
Dra Dery aponta que uma liderança responsiva trabalha para garantir e facilitar o desenvolvimento e melhoria constante do 'employee experience'. Fora isso, possui uma visão articulada, capaz de linkar o espaço de trabalho aos objetivos estratégicos da empresa, estimulando novos comportamentos no time.
Esse ponto seria essencial no desenvolvimento da sua transformação digital já que esses líderes devem ser os embaixadores do 'código de conduta' esperado dos funcionários, assim como os influenciadores que darão vida às novas normas e mindset inovadores.
Como facilitadores, esses líderes precisam criar um mecanismo sistemático de aprendizado. Treinamentos sobre a cultura da empresa, celebração de novas ideias e inovações criadas dentro do negócio, programas de reverse mentoring, compartilhar experiências positivas e conquistas de funcionários na empresa, entre outras iniciativas se tornam chave no desenvolvimento desse ponto.
DBS Bank, Deloitte Australia, e Audi são algumas empresas que investiram em construir símbolos e processos que reforçaram a aplicação de uma liderança responsiva para melhorar o 'employee experience' e assim conseguirem alavancar sua transformação digital.
Mas como dar um primeiro passo? Alguns exemplos de como o Google faz isso diariamente:
- Os funcionários são incentivados a criarem e participarem de comitês que acharem interessantes. Por exemplo, você pode fazer parte de um comitê de cultura, onde você e seu grupo pensarão juntos em como criar eventos e solucionar questões para manter viva a essência da empresa. Existem vários outros exemplos, mas o ponto aqui é a forma que os funcionários se sentem empoderados por serem 'donos' e ajudarem a construir o que a empresa é.
- Feedback faz parte do dia a dia. Após uma reunião importante ou uma apresentação, sobre a comida servida na semana, sobre a palestra promovida toda quinta feira, sobre o time que você trabalha, sobre produtos que você pode testar: lá você encontra um formulário de feedback. Quando falamos de feedback muitas vezes pensamos em algo negativo, mas o conceito aqui é totalmente diferente. Feedback no Google é uma outra forma de empoderar seus funcionários a dizerem o que é bom ou não, e gerar constantes conversas sobre tudo pode ser melhorado. Os líderes não só incentivam esse comportamento, como também cobram se os feedbacks foram de fato considerados e implementados.
- Grandes líderes como Sundar, Sergey, e Larry são mais presentes do que você imagina. Mesmo não trabalhando no headoffice você pode acompanhar semanalmente transmissões ao vivo deles falando sobre o futuro da empresa. Você pode estar muito longe do topo, mas mesmo assim terá uma visão muito clara das transformações e visão estratégica da empresa.
Quando falamos de transformação digital logo pensamos em como iremos construir algo para melhorar algo que está fora da empresa, como a experiência do nosso consumidor. O que esse artigo nos mostra é como é importante começar nossa transformação por dentro, habilitando a forma que nossos times de conectam e que nossos líderes guiam e influenciam.
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Diretor de Supply Chain | Suprimentos | Operações
3 aParabéns Duda, excelente matéria !!
Analista de Marketing Pleno na Unicred do Brasil | Marketing de Conteúdo | Social Media | Inbound Marketing
6 aVictor Dellorto Lucas Braum achei interessante compartilhar o artigo com vocês! tem algumas ideias de escritório :) hehehe
SISPRO | UX/UI Desgin e Marketing de produtos digitais
6 aPedro Petrucci
Manager Engenharia e Gestão Imóveis
7 aO ovo de Colombo. Porque não é assim em todo o "lado"?